terça-feira, 2 de agosto de 2011

Meus amigos

Jorge Adelar Finatto


photo: j.finatto


Não esqueçam
de me visitar
nas noites
de inverno
quando o medo
cobra caro
e as feridas
não deixam mentir

insolúvel jogo
de espelhos
entre mim
e o que fui

ando bêbado
pela casa
meu coração
é operário
desempregado
com filho pra criar
mulher feia
sem crédito no armazém

me enrosco
em invenções
inúteis
pra repartir contigo
um espaço de ternura

sinto umas
coisas estranhas
caminharem atrás de mim
um cano de fuzil
um casal de velhos famintos
um câncer
e me desagrada não ser
como certos fantasmas

convoco o
silêncio e
suas raízes

inauguro a
manhã

não, eu não sou
uma estrela
um rio
um barco
nada se compara
ao que sinto

preciso todos
ao redor da mesa
principalmente
os desaparecidos
como certos crepúsculos
que a gente vê
fogem e nunca mais

__________________

Poema do livro Claridade, co-edição Prefeitura Municipal de Porto Alegre, Editora Movimento, Porto Alegre, 1983.

4 comentários:

  1. Este é mais um de teus poemas hours-concours, de um livro maravilhoso.
    Vou divulgá-lo em meu Facebook para que outros escritores conheçam tua obra e teu site.

    Abraço.


    Ricardo Mainieri

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  2. Só posso te agradecer, estimado amigo e poeta Ricardo.

    Conseguir ver valor nos outros é uma mostra de elevado padrão ético e bondade.

    Um grande abraço.

    Adelar

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  3. Caro Adelar, talvez um amigo comum, apresentou-me ao "fazedor de auroras".

    Surpresa ao me encontrar com recordações dos amigos e do crédito no armazém

    Postei algo particular para compartilhar contigo

    MEUS AMIGOS

    Com crédito no armazém
    O estômago vazio
    Assim me consolidei

    Brioso

    Minha mãe dizia,
    Desse jeito forja-se o aço

    Sem crédito no armazém
    O caderno sem espaço
    Assim me atolei

    Engasgado

    Minha mãe dizia,
    Desse jeito se arranha o aço


    Com vergonha
    Sem vigor
    Assim fiquei

    Ofuscado

    Minha mãe, então, disse:
    Assim, não te conheço

    Amigos, onde estão?

    abraços

    CRM

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  4. Caro poeta.

    Fico feliz com sua presença e com os textos que enviou. A gente se "consolida" nas coisas que escreve. Me lembro que se escrevia em papel de pão na minha infância. Claro, me refiro aos tempos primitivos em que, com outros colegas, tínhamos aulas na Arca de Noé, com o próprio...

    Desculpe a desmemória, mas não identifico as iniciais.

    Um grande abraço.

    Adelar

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