sexta-feira, 15 de abril de 2011

O peixe da boca vermelha

Jorge Adelar Finatto
photos: j.finatto

photo: j.finatto


A caminhada polifônica destina-se não apenas ao exercício do corpo como à indispensável atenção às coisas do espírito.

A observação dos seres vivos e da paisagem, a aproximação estética e sensorial da mãe natureza, a respiração do ar limpo e fresco das manhãs (ou tardes), a descoberta de inefáveis epifanias durante o percurso, tudo isso faz parte da polifonia andante.



Andava eu nas cercanias do Lago da Neblina, em Passo dos Ausentes, prevenido com a invencível Coruja, a vetusta máquina fotográfica que me acompanha. Os gansos desistiram de acusar a minha presença. Sabem que sou apenas um caminhante que está só de passagem, um sujeito inofensivo, que anda a bordo de um chapéu de palha branco, com grossas e estapafúrdias lentes nos óculos, catando o invisível.


Um indivíduo assim não oferece risco à fauna e à flora, quiçá a si mesmo.


Nas margens e dentro do lago existe vida pulsante. Estava eu olhando o vazio (essa maneira de encontrar, talvez, o inesperado) quando ouvi um vago rumor na água.



Foi quando me apareceu o amigo (ou amiga) dessas fotos.



Um peixe branco, a boca pintada de vermelho, com traços coloridos espalhados pelo corpo, cerca de 1 metro de comprimento, passou a navegar perto de mim.

Tive a impressão de que sabia da sessão de fotos, ao menos não poupou poses e movimentos. Chegou-se mais para a beira, mas não tão próximo que não pudesse ativar um plano emergencial de fuga caso isso fosse necessário. Não foi.



O peixe da boca vermelha quis dizer alguma coisa com sua presença, e acho que conseguiu. Encheu de beleza a tarde e o meu coração.



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Fotos: J. Finatto
Texto publicado em 25 de janeiro, 2011.

Among maple trees

Jorge Adelar Finatto


Among maple trees
and butterflies
the boy plays

against the street misery
and the family tragedy
he grows up

for a moment
at the world's dawn
the boy spins

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Poem from the book O Fazedor de Auroras, Instituto Estadual do Livro, Porto Alegre, 1990.
Foto: Photo: J. Finatto