segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O instante é nossa eternidade

Jorge Adelar Finatto

photo: j.finatto

A caminhada polifônica, essa que se faz para a observação da natureza e o alimento do espírito, precisa se adaptar às inclemências do clima.

O calor do verão dá muita canseira. Há quem goste (o que é de gosto regala a vida, diz o provérbio popular).

Quer dizer, um chapéu de palha é importante, assim também um cantil com água fresca, um borzeguim leve, não obstante robusto. Não esquecer, claro, telescópio, calepino e a Coruja, a câmara de revelar o mundo. Enfim, coisas do caminhante.

photo: j.finatto

Aqui na serra não se está de todo livre da força sufocante do astro-rei. Mas há a brisa generosa, o vento correndo nos cânions, os arroios, as árvores, sombras benignas.

As hortênsias já agora começam murchar, exaustas de tanta luz solar. Em compensação, inicia a vindima. O cheiro da uva nos parreirais e cestos de vime é uma promessa de felicidade. O sabor na boca das pretas, brancas e rosadas é pura epifania.

A polifonia andante demanda persistência, olhar inaugural e uma certa leveza no coração. Sim, leveza, sem a qual até o primitivo azul do céu nos oprime.

photo: j.finatto

O caminho oferece miradas. Lá longe, no vale, a casa branca entre os pinheiros. Crianças correm em volta. Uma mulher estende roupas no varal. São traços de tinta dentro da pintura.

Caminhemos, caminhemos sem pressa, disponíveis aos apelos do campo. Quem sabe encontraremos um bosque na beira do entardecer, pra descansar, fazer algumas anotações, sentir o tempo pulsar.

Somos figuras efêmeras numa irrepetível aquarela de verão. O instante é a nossa eternidade.

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Leia mais sobre a caminhada polifônica em O peixe da boca vermelha:
http://ofazedordeauroras.blogspot.com/2011/04/o-peixe-da-boca-vermelha.html

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