segunda-feira, 21 de maio de 2012

Música na estação de trem

Jorge Adelar Finatto

photo: j.finatto

Às vezes, quando vejo alguém sentado no velho banco da estação de trem abandonada de Passo dos Ausentes, me lembro dos que partiram dessa cidade fantasma.

Tenho vontade de sair por aí e recolhê-los, ampará-los na infinita solidão de quem perdeu seu lugar no mundo.

Algumas palmeiras cercam a pequena estação. O último trem está lá parado. Agora os cáquis - maduros - douram as manhãs de outono perto dos trilhos.

Juan Niebla, 86 anos, costuma chegar pelas quatro da tarde para tocar seu bandoneón. O músico cego assumiu o posto em 1941, aos 15 anos, por concurso público.

Desde então não faltou um dia sequer. Acomoda-se no banco de peroba-rosa e toca algumas músicas. Transita entre Chopin, Debussy, Villa-Lobos, Ravel, Piazzolla e outros.

photo: j.finatto

A função de músico da estação começou com Honoratto Santos, que ocupou o cargo até a morte, em pleno trabalho, aos 80 anos. Tocava instrumentos de sopro como virtuose, especialmente o trompete.

Dizem que Honoratto era natural de Moçambique; alguns afirmam que veio menino ainda de São Tomé e Príncipe. Mas no documento de identidade consta como natural de Passo dos Ausentes.

O músico da estação tinha por ofício alegrar aqueles viajantes que chegavam à nossa cidade e amenizar a tristeza dos que partiam.

O trem acabou em 1950.

Juan Niebla diz que não importa: - Continuo tocando na estação porque quero estar aqui no dia em que o trem voltar. Um dia ele voltará a subir e descer essas serras.

- Enquanto isso, toco para os fantasmas.  E para os amigos que vêm me visitar nas quintas-feiras.


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Mais sobre o músico Juan Niebla:
http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/2011/07/conversa-na-estacao.html