sábado, 1 de dezembro de 2012

Palavra viva

Jorge Adelar Finatto
 

photo: j.finatto. Passo dos Ausentes. Vale do Olhar


Nem todo livro se escreve só por vaidade.

Numa certa medida, a vaidade, sem exageros, faz bem. Como quando nos leva a cuidar melhor de nós e dos outros. É benigna se se traduz em maior zelo pelo modo como fazemos as coisas.

A vaidade, por exemplo, do trabalho bem feito é justa. 

Os melhores textos, creio, surgem a partir de motivações internas profundas, que se impõem movidas pela necessidade de expressar e comunicar.

Escrevemos para entender melhor o mundo e a nós, para sermos ouvidos e, se possível, amados. 
 
Como o músico, o escritor dedilha seu instrumento. Um toco de lápis sobre a folha de papel.

Escrever é um concerto solitário num teatro vazio.

Quem escreve espera que haja alguém do outro lado. Nem sempre há.
 
Meu primeiro contato com a palavra foi através do jornal que o avô lia, ao lado da janela por onde o dia entrava. E também através das cartas que ele escrevia, com a caneta de tinta azul, e daquelas que recebia.

Amar os livros e gostar de escrever é uma coisa. Viver de literatura é outra. No início, achei que como jornalista estaria mais perto da literatura do que em outras profissões. Não era verdade.

A grande carga de trabalho do jornalismo, a intensidade e as preocupações da profissão não permitem maior elaboração do texto. A disponibilidade de espírito para criar fica muito prejudicada. O estresse é constante.

Não consegui em outras profissões o que não alcancei no jornalismo: conciliar trabalho e criação. Descobri que escrever literatura não combina com sobrevivência. Contam-se nos dedos os que conseguem ganhar a vida escrevendo. 

Escrever é uma atividade clandestina, exercida nas horas mortas (na verdade, as mais vivas).  Pelo menos pra mim tem sido assim, falta-me talvez engenho e arte para reunir as coisas.

O ato de escrever é o que traduz melhor a procura de transcendência na minha passagem pela condição humana.

Escrevo com gosto e entusiasmo e nunca fiz disso meio de vida. Sou amador na inteira extensão do termo: amo o que faço e o faço de forma não profissional.