sábado, 25 de outubro de 2014

A tragédia do pinheiro: retrato brasileiro

Jorge Adelar Finatto

foto: Corpo de Bombeiros
 
A vida sabe ser injusta e dura com os pobres.
 
Na madrugada de domingo (19 de outubro), ventava demais na serra do Rio Grande do Sul. Lá pelas quatro da manhã temi pelo que poderia acontecer, tal a intensidade das violentas rajadas. O tempo vinha mau há vários dias com chuvaradas, ventos, raios e granizo.
 
Na segunda-feira, de passagem por Gramado, parei para tomar um café. Soube, então, com profunda tristeza, que uma jovem de 29 anos, mãe de quatro filhos, havia morrido na antemanhã do domingo enquanto dormia, no bairro Jardim, após a queda de uma grande araucária sobre a casa de madeira onde vivia, na Travessa dos Pinheiros. A força do vento derrubou a árvore. 
 
O companheiro da vítima ficou muito ferido e teve de ser hospitalizado na UTI. Dos quatro filhos, apenas dois estavam na casa e, felizmente, nada sofreram apesar de toda a destruição.
 
Segundo jornais da cidade*, as autoridades do Município lamentaram o fato e prometeram ajudar a família. Destacaram, porém, que aquele local é área de preservação ambiental permanente, daí a presença ali de pinheiros. Moradias como a da vítima estavam construídas irregularmente. 
 
Familiares, vizinhos e amigos protestaram, na segunda-feira, diante da Prefeitura, afirmando que já haviam pedido providências ao Município para que realizasse o corte de algumas araucárias que ofereciam risco às casas. Foram informados de que já tinha sido expedido alvará para os cortes, mas o acidente aconteceu antes da medida ser concretizada.
 
Pois bem, o que mais dói nessa tristíssima história, além da morte da jovem mãe, que trabalhava como camareira, é a orfandade que se abate sobre seus quatro filhos. As crianças têm idades de 3, 6, 8 e 11 anos. Perder a mãe no começo da vida é uma das piores coisas que podem acontecer a um ser humano.

Vale recordar que ninguém constrói casa em área verde e de risco por mero capricho, mas sim por necessidade. As pessoas são levadas a isso por falta de condições econômicas, na grande maioria dos casos. É gente pobre que luta com imensas dificuldades, que levanta sua casa não onde quer, mas onde dá.
 
De acordo com informações dos jornais, a Prefeitura de Gramado pretende transferir famílias daquela localidade para outra que ainda está por ser definida. Não é tarefa fácil, mas cabe ao Município definir as áreas onde a população possa morar com dignidade e segurança.

O que espero é que, ao final, não se atribua à pobre mãe a culpa pela tragédia que lhe tirou a vida, por uma questão de respeito mínimo diante de um acontecimento como esse e das circunstâncias que o cercam, que englobam um fato natural trágico e um sério problema habitacional.

Como ninguém pode devolver a mãe aos pequenos órfãos, que pelo menos as autoridades e a comunidade de Gramado (um dos principais destinos turísticos do Brasil) façam esforços para possibilitar a sobrevivência digna destas crianças, diminuindo em parte seu imenso sofrimento.
 
Nenhuma mãe devia morrer desse jeito. Nenhum filho devia passar por isso.
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*Jornal de Gramado e Jornal Integração, edições de 21.10.2014.
 

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