terça-feira, 19 de abril de 2016
segunda-feira, 4 de abril de 2016
terça-feira, 29 de março de 2016
Como habitar o dia sem freqüentar a morte (I)
Jorge Adelar Finatto
photo: jfinatto |
Que a escrita seja sempre um ato de
vida e esperança. Clara luz de uma estrela
atravessando um tempo mau.
& & &
Em vez de
proibir os beijos com batom (no túmulo de Oscar Wilde, Cemitério de
Père-Lachaise, Paris), deviam acolher esses beijos, recebê-los como uma
dádiva, como luminosa manifestação de carinho a quem, em vida, foi condenado criminalmente por amar.
Ao invés de preocupar-se em proteger a integridade
fria do mausoléu, deviam dar abrigo a esses lábios amorosos, dar-lhes o aconchego
que bem merecem.
Os cálidos beijos sobre a dura pedra
teciam o monumento imaterial a ser preservado acima de tudo, em tempos de
pouco afeto e escassa demonstração de calor humano.*
& & &
Os pássaros
tratam de viver, ao contrário de nós, ocupados demais com a morte.
Eu bem que tentei olhar a vida como eles, mas ainda
não consegui. Talvez porque me faltem asas.
& & &
Aprendi com os pássaros que eles são felizes ao
natural. Vivem com o que têm e sentem-se bem assim. Não querem mais do que a
natureza lhes oferece. A vida é breve. Aproveitam o dom de estar vivos.
& & &
A volúpia
de publicar muitos livros para ser reconhecido, às vezes, faz um autor se
perder. Ser bom de venda e de mídia não significa ser bom escritor, embora
faça bem para a vaidade, para a vida social e para o bolso.
Mas cada um é cada qual. Ninguém deposita flores no monumento ao escritor desconhecido.
& & & Mas cada um é cada qual. Ninguém deposita flores no monumento ao escritor desconhecido.
Eu sou
antes de tudo um leitor. Espero que os escritores fora de comércio continuem seu
trabalho. Não desistam, resistam, sobrevivam. O resto é o
que vem depois, mas isso ninguém sabe.
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*Oscar Wilde e o beijo proibido:
http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/2013/06/oscar-wilde-e-o-beijo-proibido.html
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monumento ao escritor desconhecido
sábado, 26 de março de 2016
Ressurreição pra todos
Jorge Finatto
quaresmeira em flor. photo: jfinatto |
Ninguém podia imaginar que, passada a ditadura, outra escuridão nos esperava - profunda, espessa e dolorosa - essa que estamos atravessando. Mas vai passar.
A claridade há de expulsar as trevas da corrupção, do cinismo, do desamor às pessoas, da luta rasteira pelo poder a qualquer preço.
Não é mais possível continuar desse jeito.
Não é mais possível continuar desse jeito.
As pessoas de bem - de todas as ideologias, partidos, grupos e credos - haverão de colocar o Brasil acima dos interesses mesquinhos, acima da violência, acima da desesperança e do desastre.
A luz dos espíritos esclarecidos, o diálogo, a capacidade de reconhecer os próprios erros e de se colocar no lugar do outro acabarão por vencer os oráculos da morte.
Nesta Páscoa, e nos dias que virão, Feliz Ressurreição a todos!
domingo, 20 de março de 2016
A lágrima
Jorge Finatto
As percas. O irremediável na vida da pessoa. Os olhos pretos, pretos. Acesos. Os negros cabelos caíam-lhe nos ombros. No então eu habitava o calabouço. Agonia em mim costumada. As esperas.
Ela surgiu um dia no abrigo, as carinhas nossas. Vestia casaco azul-marinho, lenço branco no pescoço. Quando vi aquela iluminação, meu coração saltou saltos. Pensei no vazio de mim: o que, a estrela da minha vida, essa? Nunca esqueço.
A Encantada. Os olhos dela me encontraram. Escolheu a minha frágil escondida criatura. Havia muitos outros habitantes do calabouço aguardando amanhecer. No limbo, esperando a face do milagre. Os esquecidos.
A Encantada me pegou nos braços. O meu filho, disse. Passei a ser o amoroso. Os baldos. Meu coração cavalo cego na alegria. Quem me via, falava: esse tal, o príncipe. O escolhido. A Encantada inaugurou minha vida. A estrela. Eu príncipe. Ela disse: menino agora é meu filho no rigor da lei e pessoa da minha alma. Tive outro menino, disse ela, olhando o esmo. Do meu sangue próprio. Perdi nos prelúdios, tinha quatro anos. As percas. As esfumações.
Cresci com esse invisível irmão. O finado. O sempre lembrado. Às vezes eu conversava com ele. A mãe era sozinha no mundo. A mãe tinha os momentos. As lonjuras. Carregava o menino morto no regaço do coração. Caminhava no outro mundo com seus desaparecidos. A mãe tinha segredos guardados. Ninguém entrava ali. Ai de quem.
O meu filho, dizia. A mãe fazia eu dormir no colo, na frente do fogão a lenha, até os seis anos. O príncipe. A mãe levava o filho vivo passear na praça. O mundo conhecesse o amoroso. A solitária da Rua São João e seu menino vivo. Eu tive, depois perdi. O coração da mãe tinha umas ausências, sustos, sufocos. Um dia estranhei aquele sono esquecido de acordar. Fui no quarto. Ela deitada. O rosto lindo inclinado. Os olhos pretos, pretos, abertos. Havia uma lágrima transparente. Eu me vi dentro daquela lágrima. A boca parecia rir um pouquinho. Tinha eu seis anos. O escolhido.
Peguei na mão da Encantada. Fiquei dois dias sentado no chão ao lado dela, esperando ela retornar. A mão muito fria. A testa que beijei, gelada. A mãe não regressou. Os silêncios. Disse no dentro do fundo do meu coração: vou junto. Aqui não fico mais. A vida não vale, acabou. Odiei ter renascido. O escolhido. Ódio, ódios envenenados senti. Um vizinho, vizinhos, forçaram a porta, sobejaram pela casa. Os espantos. Me tiraram de lá, no forçado. Eu gritei deveras os tristes gritos. Me deixem, me deixem. O pobre, diziam, o pobre príncipe.
Nos retratos a nossa vida em família: a mãe, o sempre lembrado, eu. O príncipe partido. Sobrevivo a mim mesmo. Sou uma ausência afogado na lágrima. O frio, frios dentro em mim.
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Texto publicado em 22 de maio, 2010.
terça-feira, 15 de março de 2016
Jungfraujoch, Top of Europe
Jorge Finatto
Vista do vale em Jungfraujoch, Suíça. photo: jfinatto |
Chegar à estação de trem mais alta da Europa, em Jungfraujoch, no cantão de Berna, Suíça central, requer paciência e fé. E uma alma aberta para encontrar esse tipo singular de beleza. Um pouco de jogo de cintura é importante para encarar a subida por estradas de ferro sinuosas e a pique, entre as altas e álgidas montanhas alpinas.
Um velho e bom capote é indispensável. Este item, aliás, não é problema para quem vem de Passo dos Ausentes, como eu, terra de grossos e impermeáveis casacões de lã, tecidos na mais que secular manufatura local. Os tradicionais agasalhos ausentinos são imprescindíveis para enfrentar os furiosos ventos austrais que nos assolam naquela boa terra, assim como as chuvas, as geadas, os nevoeiros e nevascas.
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photo: www.swisstravelsystem.com/pt |
Encasacado e a bordo do vetusto chapéu azul-marinho, saí do hotel e fui até a estação de trem da pacata Interlaken (pouco mais de 5 mil habitantes). São necessários 3 trens para chegar a Jungfraujoch.
Embarquei no primeiro que vai escarpas acima até Lauterbrunnen. Aí pega-se outro que nos leva a Kleine Scheidegg. Por fim, o terceiro comboio se dirige a Jungfraujoch, passo entre as montanhas de Jungfrau e Mönch, onde está a estação de trem do topo da Europa.
Para subir os 3.454 metros de altitude, é necessário trem de cremalheira, isto é, com roda dentada central para engrenar no trilho dentado no meio dos trilhos, única maneira de vencer a íngreme subida. Do contrário, a composição voltaria para trás ou simplesmente não iria adiante.
No meio do caminho, há paradas em locais de ampla visão para fazer fotos. Lá enfim chegando, me aventurei a sair da estação e enfrentar a neve e o gelo escorregadio naquelas alturas. Fazia um frio de 26ºC negativos e ventava. Fiz algumas fotos, em poucos minutos, e retornei para tomar um chocolate quente.
Esperei, retomei o fôlego e saí novamente. Fiquei mais alguns momentos catando imagens, olhando as montanhas a perder de vista, nos quatro cantos, cobertas de níveo chantili. Só não é mais bonito do que os paredões dos Campos de Cima do Esquecimento.
As mãos e o rosto congelados, voltei à estação de onde não mais saí, enovelado dentro do capote ausentino, esperando o trem de retorno. Uma linda moça oriental perguntou se eu queria que ela fizesse uma foto minha diante da janela (onde eu estava sentado) que dá para o vale gelado. Concordei, claro. Por um desses mistérios que nunca entendi, não apareço em fotos nem em retratos (sou invisível talvez). Mas isso também não importa. Importa é a vista do lugar desenhada em finos e inspirados traços por Deus.
Embarquei no primeiro que vai escarpas acima até Lauterbrunnen. Aí pega-se outro que nos leva a Kleine Scheidegg. Por fim, o terceiro comboio se dirige a Jungfraujoch, passo entre as montanhas de Jungfrau e Mönch, onde está a estação de trem do topo da Europa.
Visão a partir de Jungfraujoch. photo: jfinatto |
Para subir os 3.454 metros de altitude, é necessário trem de cremalheira, isto é, com roda dentada central para engrenar no trilho dentado no meio dos trilhos, única maneira de vencer a íngreme subida. Do contrário, a composição voltaria para trás ou simplesmente não iria adiante.
Observatório de Sphinx em Jungfraujoch. photo: jfinatto |
No meio do caminho, há paradas em locais de ampla visão para fazer fotos. Lá enfim chegando, me aventurei a sair da estação e enfrentar a neve e o gelo escorregadio naquelas alturas. Fazia um frio de 26ºC negativos e ventava. Fiz algumas fotos, em poucos minutos, e retornei para tomar um chocolate quente.
Esperei, retomei o fôlego e saí novamente. Fiquei mais alguns momentos catando imagens, olhando as montanhas a perder de vista, nos quatro cantos, cobertas de níveo chantili. Só não é mais bonito do que os paredões dos Campos de Cima do Esquecimento.
As mãos e o rosto congelados, voltei à estação de onde não mais saí, enovelado dentro do capote ausentino, esperando o trem de retorno. Uma linda moça oriental perguntou se eu queria que ela fizesse uma foto minha diante da janela (onde eu estava sentado) que dá para o vale gelado. Concordei, claro. Por um desses mistérios que nunca entendi, não apareço em fotos nem em retratos (sou invisível talvez). Mas isso também não importa. Importa é a vista do lugar desenhada em finos e inspirados traços por Deus.
Subida a Jungfrau. photo: jfinatto |
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Suíça
domingo, 13 de março de 2016
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