quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

Bondes de Zurique

Jorge Finatto
 
photo: jfinatto
 

EU SEMPRE TIVE um encanto pelos bondes (elétricos em Portugal). Na minha infância e adolescência havia muitos em Porto Alegre, servindo diversos bairros. Eu viajava sempre neles. Era um transporte bem pensado, em baixa e média velocidades, acho que não alcançava 50 km/h. Tinha muito a ver com casas nas ruas, árvores e tempo para viver.
 
Depois acabaram com os bondes. Assim como acabaram com os trens no Brasil, algo inacreditável num país imenso. Resultado: hoje morrem milhares nas estradas superlotadas de automóveis e caminhões, em mau estado de conservação. O transporte de cargas é caro, encarecendo tudo. Decisões erradas como essa levaram o país a este estado lamentável.
 
Mas eu queria dizer que estou matando a saudade dos bondes em Zurique. E já matei um bocado da saudade dos trens em viagens internas pela Suíça e para a França. O trem francês não é tão bom. Os trens e bondes suíços são incomparáveis em limpeza, conforto, silêncio e pontualidade. Os serviços funcionam, não são complicados. E nos bondes não vi fiscais examinando se o sujeito comprou ou não a passagem. Nos trens a fiscalização é mais presente, mas não sufocante como em outros países.
 
Há uma consciência social muito forte. As pessoas sabem que devem cumprir a lei e o fazem porque acreditam nisso. Todo mundo ganha. Não é como no Brasil onde a lei é para os outros. E todos perdem. Um dia, espero, nos livraremos dessa praga.
 
A cor dos bondes é azul cobalto e branco. Como no céu. Uma delícia.

photo: jfinatto
 

quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

A cidade do olhar

Jorge Finatto

Petite France. Estrasburgo. photo: jfinatto
 
ESTRASBURGO é uma danação para o fotógrafo. Pra todo lado que se olhe, há beleza, história, ruazinhas perdidas no tempo e o rio L'ill que atravessa a cidade em vários braços. Está situada à beira do rio Reno (margem esquerda), que separa França e Alemanha. Do outro lado da ponte fica a germânica Kehl, que se visita pegando um bonde.
 
Segunda mais importante cidade universitária da França, logo após Paris, capital da região da Alsácia, sede do Parlamento Europeu e da Corte Europeia de Direitos Humanos, tem pelo menos dois mil anos (foi fundada pelos romanos no ano 12 antes de Cristo como reduto militar).
 
Ao longo do tempo Estrasburgo foi disputada por alemães e franceses, pertencendo ora a um lado ora a outro. As duas influências são visíveis em todos os aspectos, do lingüístico-cultural ao gastronômico, passando por edificações e organização urbana. Mas se se pergunta a um alsaciano como se sente, ele em geral responderá: nem alemão nem francês: alsaciano.

Estrasburgo. photo: jfinatto

A Petite France é a joia da coroa, bairro histórico declarado Patrimônio Mundial pela Unesco, com suas casas em enxaimel, suas pontes, suas vielas que mergulham nos séculos. A catedral de Notre Dame, de 1439, é uma monumental obra em estilo gótico, das mais impressionantes que já vi.
 
Estrasburgo sofreu com a ocupação nazista que assolou a França. Foi bombardeada pelos americanos mas sobreviveu. Colmar, cidade próxima, foi a última cidade francesa a ser abandonada pelo exército de Hitler no fim da Segunda Guerra Mundial.

Petite France, Estrasburgo. photo: jfinatto

O grande arquiteto Le Corbusier disse que em Estrasburgo o olhar não se cansa. De fato, quanto mais se olha mais se descobrem coisas. É um lugar que seduz o olhar e os passos do viajante o tempo todo.

Estrasburgo. photo: jfinatto
 

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Deus é brasileiro, mas passa férias na Suíça

Jorge Finatto
 
 
Gryon, Suíça. photo: jfinatto
DIZEM, os muito otimistas, que Deus é brasileiro. Tenho sérias dúvidas a respeito. Mas se for, será esta proximidade com Ele que nos faz levantar todos os dias e ir atrás da sobrevivência e de um sonho, num ambiente de tanta corrupção, violência, injustiça e impunidade (embora, neste caso, haja sinais de que a coisa começa a mudar).
 
Todo mundo precisa de um sonho. E de um descanso do inferno que é a vida real. Fico pensando que o Criador deve, às vezes, cansado de tanta dura realidade, deve vir passar umas férias aqui na Suíça, lugar onde colocou um bocado de seu engenho e arte. Onde temos a impressão de que o projeto humano poderá, enfim, dar certo um dia.
 
Lago Genebra ou Léman, Suíça. photo: jfinatto
 
Nós temos toda beleza do mundo na Terra de Vera Cruz, todos os tipos humanos e recursos naturais, mas não temos consciência social, e por isso não temos paz, e a esperança ultimamente anda escondida. Mas não está morta.
 
Que nosso Conterrâneo nos ajude a vencer as dificuldades. E, para ajudá-lo, façamos nossa parte olhando nossos irmãos.
 

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Os trilhos mostram o caminho

Jorge Finatto

Montreux. photo: jfinatto


UM TREM parou na estação de Berna e eu não peguei. Não sabia aonde ir. Sentei sobre a mala, fiquei olhando os trilhos. Esperava uma inspiração qualquer enquanto outros viajantes tomavam seus comboios seguindo cada um seu destino. Mas os trilhos não disseram nada. Observei, contudo, que rumam sempre para frente. Nunca ficam parados. Decidi então fazer como eles e entrei no próximo trem.

domingo, 21 de janeiro de 2018

Homens e cidades

Jorge Finatto

vitrine em Berna. photo: jfinatto
NO DOMINGO gelado e garoento de Berna, tirei o dia para andar nas ruas da velha cidade e visitar museus.

A cidade em si é já um museu a céu aberto, história e arquitetura dando testemunho de tempos, ideias e personagens.

As cidades ficam, os homens passam. Alguns deixam rastros, outros nem isso. A vida segue como um bastão nas mãos daqueles que vão nascendo e ocupando o espaço e não deixam o lugar desaparecer.

Casa de Einstein. photo: jfinatto
Capital da Suíça, Berna tem porte médio, nem muito grande nem pequena. Tem arte, cultura, fontes de água potável pelas ruas, muitos cafés. E gente que aprecia perambular, andar de bicicleta, ler, olhar. Berna gosta de ser descoberta.

A casa onde Einstein viveu na época em que concebeu a Teoria da Relatividade, num pequeno prédio, está ali para uma visita. A seus pés, um café leva o nome do cientista. O Museu Einstein, mais adiante, do outro lado do lindo rio Aare, vale a visita. No mesmo exuberante edifício funciona o Museu de Berna.

photo: jfinatto

Depois fui ao Centro Paul Klee que além da expor a obra do artista reúne várias outras atividades, como oficinas de pintura para crianças. É um grande mosaico cultural e merece mais de uma visita.

vitrine. Berna. photo: jfinatto
No mais, além de especular as vitrines(sem intenção de compra, as lojas estão fechadas e o preço em francos suíços anda nas alturas),  fiz uma das coisas de que mais gosto: andar de bonde. O hotel fornece bilhetes aos hóspedes para utilizar gratuitamente o transporte público. Um belo mimo. 

Essas anotações são apenas um rascunho, há muito mais para comentar e destacar. Começando pela notável obra de Paul Klee. Por ora, vão assim, no ritmo fragmentado e ligeiro do olhar do viajante. No instagram estou publicando mais fotos.
a tentação dos bondinhos. Berna. photo: jfinatto

sábado, 20 de janeiro de 2018

Jeito suíço

Jorge Finatto
 
amanhece sobre o Atlântico, 20/01/2018. photo: jfinatto
 

PASSAR DOZE HORAS no tubo de um avião é um negócio cada vez mais complicado para este pobre vivente. Chego exausto, tresnoitado, estropiado. Do aeroporto de Zurique a Berna, cerca de uma hora de trem. A neve caindo, lindo.
 
Os suíços são gentis, da paz, geralmente tratam bem o estrangeiro. Nas vezes em que vim aqui foi isso que vi. Nenhum ranço xenófobo, nenhuma hostilidade. O país tem oito milhões de habitantes e dois destes milhões são pessoas de outras nações. Muitas culturas.
 
Adquirir a nacionalidade suíça, por outro lado, é muito difícil. O falecido e imortal Jorge Luis Borges, glória da literatura mundial, que o diga: tentou e teve o pedido negado. Ironicamente morreu nesta terra e está enterrado em Genebra. Como se diz, nem tudo é perfeito.
 
Boa educação, escolaridade, acesso aos bens da vida para todos. Participação direta dos cidadãos em todas as decisões, desde as que regulam a vida do quarteirão até as que afetam a federação. Tudo se discute e decide democraticamente.
 
Neutralidade em guerras, civilidade, alta renda per capita, uma das melhores qualidades de vida do planeta, tecnologia de ponta em vários setores, um patrimônio natural e paisagístico de tirar o fôlego.
 
Teríamos muito a aprender com os suíços em comportamento, valores e práticas. Imaginem o Brasil com padrão suíço adaptado ao nosso meio, com a nossa riqueza e diversidade humanas. Quem sabe um dia.
 

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Vale do Quilombo

Jorge Finatto

photo: jfinatto

Para mim o VALE DO QUILOMBO, estendido entre Gramado e Canela, é um dos lugares mais belos do mundo. As montanhas ondulam e quase se misturam ao céu. Estamos mais perto de Deus. Nos sentimos parte de algo maior.
 
Há algo espiritual nesse ambiente tomado pela leveza azul do ar. Uma amplidão de silêncio. Integração com a natureza e o invisível.
 
Vertentes dágua  emergem do interior e descem pelas encostas dos paredões de basalto cobertos de mata, levando vida ao vale.
 
Me sinto um pássaro nessas alturas. Um pássaro que não quer saber de voar para outras distâncias.