quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Literatura pra que mesmo?

Jorge Adelar Finatto


Confesso que sou um leitor tosco, desses que buscam sentido nas coisas que leem. Não apenas gosto de ler como de reler livros, e a cada nova leitura descubro coisas que antes não vi. O tempo é raro diamante. Não pode ser desperdiçado. Lutamos para escolher, entre milhares, o livro que irá nos fazer mais felizes,  mais saciados na busca de beleza e conhecimento, recompensando-nos  pelo esforço da leitura.

Li entrevista de uma escritora em que ela afirma que não acredita que a literatura possa ter uma função, nem que possa ser uma possibilidade de reflexão, de alteridade. Diz também que literatura é literatura, não tem função nenhuma e não  se pode esperar isso dela.

Não tenho pretensão de atribuir "funções" à literatura. Mas não posso disso extrair seu oposto, que é negar a ela qualquer função. Como leitor, busco nos livros prazer, encanto, conhecimento, uma espécie de felicidade que só a leitura pode trazer e que não encontro em outras coisas. 

Esse prazer e essa felicidade estão diretamente relacionados à possibilidade de construção de sentidos que a leitura oferece. O escritor escreve determinada coisa e o leitor estabelece suas  relações, faz descobertas, extrai e constrói significados. A obra literária só ganha vida nos olhos do leitor e ele próprio torna-se criador no ato de ler.

Desde que acordamos de manhã até o segundo antes de dormir, passamos o tempo procurando sentidos. Isso é assim porque temos uma consciência e não podemos apagá-la. Do outro lado, está o inconsciente, um oceano de sentidos ocultos, intuições, memórias pessoais e ancestrais que fazem parte do nosso ser.

Ninguém lê uma página ou uma linha sequer sem essa tentativa de encontrar significados. E se lemos é porque estamos em busca de alguma coisa, algo nos falta, estamos em construção.

O assunto é longo e comporta várias interpretações.  O que eu acho é que escrever e botar um livro no mundo é assunto de muita responsabilidade. Por isso custo a entender o que foi dito na entrevista. Talvez não tenha ainda alcance suficiente para compreender.

Contudo, no dia em que chegar à conclusão de que a literatura não tem função nenhuma, que não serve para refletir, nem para ver o mundo e o outro numa perspectiva diferente, no dia, em suma, em que entender que literatura é literatura, e ficar só nisso, aí então será a hora de parar e fechar o estabelecimento.

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Foto: J. Finatto. Ipê amarelo.