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sábado, 15 de abril de 2017

Maria Madalena

Jorge Finatto

photo: jfinatto
 
Maria Madalena teve o privilégio de ser a primeira a ver Jesus após a Ressurreição.  Nenhum dos apóstolos teve essa ventura. Havia nas cercanias do lugar onde ele foi assassinado (Monte Gólgota, Jerusalém) um jardim e, neste, um túmulo novo ainda não usado. Foi nele que o sepultaram José de Arimateia (discípulo secreto de Cristo, homem influente e rico) e Nicodemos, envolto o corpo em fino linho.

Enquanto ela chorava diante do túmulo, onde o corpo não estava mais, Jesus apareceu-lhe. Era de manhã muito cedo. Num primeiro momento ela não o reconheceu. Até que ele diz: "Maria!". E a alegria de Madalena é infinita. Em lágrimas, ela toca o Senhor levantado dos mortos.  Ele então lhe fala:

- Para de agarrar-te a mim. Porque ainda não ascendi para junto do Pai. Mas, vai aos meus irmãos e dize-lhes: "Eu ascendo para junto de meu Pai e vosso Pai, e para meu Deus e vosso Deus".

Impressiona o amor de Maria Madalena por Cristo e o sentimento que os unia. Ele tinha expulsado sete demônios dela e a partir de então ela passou a segui-lo e amá-lo, segundo o relato bíblico.

Em sua passagem pelo mundo, Jesus mostrou-se um ser espiritual num corpo humano. Um ser que valorizava por demais o afeto. Daí ter proclamado a importância de amarmos ao próximo como a nós mesmos. Teve o amor como algo urgente e necessário.

Estamos à véspera da Ressurreição, no domingo de Páscoa. Relendo os quatro Evangelhos por esses dias (Mateus, Marcos, Lucas e João), dei-me conta de que, durante a vida,  assim como nas horas finais e na Ressurreição, Cristo foi acompanhado de perto, modo amoroso e atento, por mulheres.

O aparecimento de Jesus a Maria Madalena é revelador disso. É prova de gratidão e de um grande carinho. Mostra que ele não era indiferente à presença feminina em sua vida, mas tinha-a em elevada consideração.

Não há informes sobre Maria Madalena (da aldeia de Magdala, cuja existência foi comprovada por recentes escavações em Israel), além dos Evangelhos. Sabe-se, por exemplo, que assistiu a Cristo e aos apóstolos com seus bens como outras mulheres também o fizeram (Lucas 8: 1, 2, 3).

Quem foi essa mulher? O que fez e como viveu? Que momentos luminosos compartilhou com Jesus? Como se passaram seus dias depois da morte de seu amado Senhor? São mistérios a desafiar interpretações e especulações.

Uma coisa, contudo, parece certa: por ser quem era e pelo seu imenso amor, ela conquistou o coração de Jesus.
 

quarta-feira, 1 de abril de 2015

A bruma de que somos feitos

Jorge Adelar Finatto
 
photo: jfinatto
 

Nestes tempos de Quaresma, existem muitas razões para ter esperança na vida futura, já que é esta a mensagem que está inscrita, a sangue, na trajetória luminosa de Cristo.
 
A Ressurreição, no domingo de Páscoa, é a culminância do sentimento cristão, e universal, de uma vida melhor, infinitamente melhor, do que essa que vivemos no fundão chamado mundo.
 
Quando fui juiz na cidade de Rio Grande, lá nos idos de 1991, escolhi esta passagem bíblica, que muito me encanta e faz refletir, para inscrever em cerâmica: Porque sois uma bruma que aparece por um pouco de tempo e depois desaparece. Trata-se do trecho 4:14 da belíssima Carta de Tiago, irmão de Jesus. Após, fui a um ateliê perto do foro e fiz a encomenda.
 
O trabalho foi feito com talento por uma artista local, cujo nome está escrito na parte inferior à direita (meus óculos de fundo de garrafa não conseguem decifrar). Levei a peça para o meu gabinete.
 
O tempo passou como voam os pássaros.

Jurisdicionei depois em outras comarcas. Esta bela obra de arte (e do espírito) sempre me acompanhou e acompanha até hoje. Compartilho seu conteúdo.
 

domingo, 20 de abril de 2014

Ressuscita-me

Jorge Adelar Finatto
 
photo: j.finatto


Não vivi até o fim o meu bocado terrestre.              
Sobre a Terra
não vivi o meu bocado de amor.

(...)

Ressuscita-me,
nem que seja só porque te esperava

como um poeta,
repelindo o absurdo quotidiano!

Ressuscita-me,
nem que seja só por isso!
                   
Ressuscita-me!
Quero viver até o fim o que me cabe!*

                                                Maiakóvski


É como se ele tivesse entrado num túnel e saído dele cinqüenta anos depois. E é também como se entre a entrada e a saída do túnel não tivesse acontecido nada de mágico e impressionante, a não ser trabalhar, trabalhar, trabalhar, trabalhar.

Um longo tempo de recolhimento, suor e silêncio.
 
Sempre ouviu dizer que tinha de ser assim. Agora ele se olha no espelho e vê os cabelos crespos em tom cinza. O olhar azul meio opaco. A boca como um risco inexpressivo.

Parece um boneco de madeira que teve na infância, um bonifrate com os olhos fixos num lugar vazio em frente e um sorriso sem graça.

Claro que os retratos na parede, com risos e olhos que já partiram, fazem com que ele exagere nos traços e nas tintas.
 
Durar não é viver. Viver não é só durar. É ser um pouco feliz a cada dia. É pedir perdão antes que os laços se cortem, para não haver remorsos depois. Antes que as pessoas desapareçam de nossas vidas e só restem retratos. E o olhar parado do bonifrate entre os livros na estante.
 
De modo que é preciso ter uma nova oportunidade, muitas, para acertar a vida e o sentimento. Ver a casa cheia de gente na Manhã de Páscoa. Ouvir a conversa e o riso das mulheres na cozinha e na sala. Beber uma taça de vinho olhando pela janela.
 
Ficar em paz no Domingo de Páscoa, vendo a névoa se espreguiçar lá fora.

E, no coração, essa vaga esperança de Ressurreição, como a do Cristo.

Porque só uma vida é muito pouco.

____________

*O poeta-operário. Antologia poética. Vladímir Maiakóvski. pp. 154-156. Tradução e estudo biográfico de Emílio Carrera Guerra. Cìrculo do Livro S.A., São Paulo, 1991.
 
 

quarta-feira, 19 de março de 2014

O país das quaresmeiras em flor

Jorge Adelar Finatto

photo: j.finatto, 15.3.2014
 
Só agora me dou conta, raro leitor, de que elas andam por aí, anunciando a Páscoa e o advento do outono. A nova estação chega cheia de significados
 
(fala de Ressurreição e de urgentes renascimentos)
 
As flores das quaresmeiras têm tudo a ver com sentir claro, respirar limpo, passar longe dos abismos.

É o que eu penso nesse instante vendo-as vibrar na claridade, apesar da densa sombra que se abate sobre o Brasil com sua triste face de corrupção e violência social

mas não é só aqui, dizem os intérpretes do caos, mas sendo aqui, digo eu, já me basta, é o suficiente para danar a minha/nossa vida.

Estamos perplexos, temerosos, impotentes, humilhados diante da realidade que nos assola.

(dizer que saímos da escuridão abissal da ditadura e acabamos nisso, nesse buraco sem fundo que suga nossa alegria, nosso trabalho, nossa paz, nosso sangue, nossos sonhos

ceifa vidas diariamente nas ruas do país sem lei, sem autoridade, sem saúde, sem educação, sem esperança (tudo, claro, garantido no papel),

trágicas ruas onde se afunda o famoso, nunca demais louvado, não obstante sempre negligenciado estado democrático de direito

- de que estado e de que direito estamos falando mesmo? -

ninguém sabe ao certo se existe de fato e o que é isto no aqui e agora, nem mesmo se depois de tanta indiferença, omissão, arrogância, malandrice, cinismo e incompetência haverá ainda um país para chorar)

photo: j.finatto, 15.3.2014
  
Mas olhando as quaresmeiras em flor, nesta hora e neste lugar, ao menos nesse efêmero instante, a morte não tem nem pode ter guarida.

As flores das quaresmeiras são o oposto da morte, negação do desespero e do abandono (longo abandono de séculos). 
 
(a delicadeza dos ramos, pétalas e cores remete a um mundo outro)
 
Um tempo de recolhimento e silenciosas caminhadas por estradas interiores nos habita na quaresma.

Olhar atento ao solitário vôo do pássaro sobre os fios de luz, tecendo destino e distância com a nossa esperança (por um fio).
 
Tempo de resistência

(como sempre)

de atravessar a ponte
 
(sobre o rio das mortes)
 
e chegar vivo do outro lado. 


photo: j.finatto, 15.3.2014