Jorge Adelar Finatto
photo: j.finatto |
Essa é a hora em que os olhos se fecharam e todos dormem. Só eu não dormi na minha rua. Não posso dormir. Existe muita coisa calada querendo falar.
No edifício da esquina uma luz se acende, não sei se numa sala ou num quarto. Talvez seja outra insônia igual a minha. Talvez uma sede em busca de um copo dágua. Talvez uma saudade da infância. Talvez um remorso. Talvez um medo. Talvez uma perda (isso que eu e meu silêncio conhecemos bem a essa hora).
Há uma luz que nunca se apaga no edifício daquela colina do outro lado. Pode ser alguém doente naquele apartamento, ou alguém conversando com fantasmas, ou que ficou só e acontece que não consegue dormir sozinho.
Muitas coisas eu vejo da minha janela noturna.
Uma mulher atravessa a rua fumando, a brasa vermelha flutua na escuridão em direção ao desconhecido, desaparece.
O olhar tem vida efêmera na furna.
As únicas realidades da noite que são belas e não têm fim são os sonhos das crianças.
Uma mulher atravessa a rua fumando, a brasa vermelha flutua na escuridão em direção ao desconhecido, desaparece.
O olhar tem vida efêmera na furna.
As únicas realidades da noite que são belas e não têm fim são os sonhos das crianças.
Eu sinto uma falta absurda de alguma coisa que não está mais aqui. Queria de volta o meu anjo da guarda pra conversar nessa hora despida e inerme, em que não há defesa possível, porque estamos muito sós, já é muito tarde, e todos na casa e na rua dormem. Como falar dessas coisas com alguém, se nem ao menos sabemos do que se trata?
Vou até a janela velar a estrela que brilha solitária acima da minha rua. Peço a ela que não me deixe sozinho na furna fria.