Jorge Adelar Finatto
Estava na livraria, no sábado de carnaval, olhando a estante como quem mira o mar de dentro do seu barco, ávido por partir. Esse olhar nunca é inocente. Há uma busca de felicidade na mão que se eleva até a prateleira.
A simples procura faz alguém feliz, essa transitória felicidade que, às vezes, nos habita em meio ao tumulto.
A velha angústia de saber que não há tempo pra ler nem a metade dos livros que gostaríamos torna a escolha um momento difícil. Mas não desanimo nem estou preso ao cânone, à obrigação de ler certas obras só porque alguém disse que tem de ser assim. Não.
Estou diante da estante, olho o mar de histórias.
Estou diante da estante, olho o mar de histórias.
Esse instante deve ser, acima de tudo, lúdico. Afinal, não bastasse a brevidade das coisas, hoje é carnaval.
Quero a leveza do barco ancorado na beira do canal. Quero um livro profano, desses que ensinam a arte de andar de bicicleta pelas ruas do bairro sem ser atropelado por isso.
Ou um que enuncie o nome dos pássaros dessa cidade, ou traduza a forma das nuvens nos céus de fevereiro.
No movimento das águas desse mar, escolhi alguns títulos que prometem boas fugas do território das ilhas: O Cemitério de Praga (romance, Umberto Eco), Um Pai de Cinema (fábula, Antonio Skármeta) e Chamadas Telefônicas (contos, Roberto Bolanõ). Pelo que li, em voo de gaivota sobre as ondas, são profanos o suficiente para alegrar o meu carnaval.
Diante da estante, sábado, olhando o mar.