Jorge Adelar Finatto
Nas antigas noites da Rua São João, os habitantes colocavam cadeiras na calçada. Conversavam sobre o passado maravilhoso e o fim do mundo que estava próximo. Era uma maneira talvez de suportar o vazio daquela vida onde nada acontecia.
Uns diziam que o mundo ia acabar em fogo. Um incêndio de proporções planetárias calcinaria os seres e todas as coisas.
Uns diziam que o mundo ia acabar em fogo. Um incêndio de proporções planetárias calcinaria os seres e todas as coisas.
Outros afirmavam que tudo ia terminar em água. Uma chuva, fininha no início, iria aumentando de volume até que ondas gigantescas mergulhariam a Terra em trevas de profundeza, onde nem os peixes sobreviveriam.
Do que Miguel observa e sente, o mundo ao redor está ruindo sem gritos nem estrondos. Como uma escultura de areia abandonada no vento da praia.
Um dia percebeu que continentes de memória e afeto desapareceram com os moradores que, como ele, emigraram para outras cidades.
Atlântidas à deriva num mar de esquecimento.
A passagem voraz do tempo erigiu ausências no coração de Miguel. Ele próprio está fora de contexto. Como uma fotografia que alguém recortou.
Um dia percebeu que continentes de memória e afeto desapareceram com os moradores que, como ele, emigraram para outras cidades.
Atlântidas à deriva num mar de esquecimento.
A passagem voraz do tempo erigiu ausências no coração de Miguel. Ele próprio está fora de contexto. Como uma fotografia que alguém recortou.
Em certas noites de insônia, ele acende a lamparina para espalhar claridade na escuridão da rua da infância.
As portas e janelas estão cerradas. Os habitantes da Rua São João flutuam no espaço. Ninguém mais sai para ouvir as histórias do fim do mundo embaixo das estrelas cadentes.
Às vezes, uma porta se abre vagarosamente. Um menino surge. Toma a mão de Miguel e anda a seu lado pela rua noturna onde ninguém mais vive.
Até que a aurora vem e o menino desaparece. Miguel segue seu caminho, deixando atrás a rua perdida.