sábado, 10 de agosto de 2013

O assassinato do ambientalista

Jorge Adelar Finatto

photo: Hernández, em imagem cedida por sua viúva. fonte: El País

O assassinato do ambientalista espanhol Gonzalo Alonso Hernández, 49 anos, ocorrido no último domingo, em seu sítio, no interior do município de Rio Claro, Estado do Rio de Janeiro, é mais um trágico acontecimento na história da luta pela preservação do meio ambiente no Brasil. Uma demonstração evidente - mais uma - do alto grau de violência que domina a sociedade brasileira.

Segundo o jornal El País*, da Espanha, Hernández, que era biólogo, estava no Brasil desde 1997. Inicialmente veio trabalhar como diretor de uma empresa de telefonia. Em 2005 decidiu largar o emprego para dedicar-se integralmente à causa da ecologia, abrindo mão do bom salário que o cargo lhe proporcionava. Passou a atuar no Parque Estadual Cunhambebe, uma reserva da Mata Atlântica, com 38 mil hectares. Conforme o periódico, ele era rigoroso na denúncia de caçadores e desmatadores, chegando até mesmo a segui-los e fotografá-los em suas atividades ilegais.
 
O informe dá conta, ainda, de que sua viúva, a brasileira Maria de Lourdes Pena Campos, e pessoas envolvidas na proteção ambiental temiam pela maneira firme e contundente com que Hernández atuava. Para os que lhe eram próximos, foi uma tragédia anunciada. De acordo com Maria de Lourdes, ele se queixava de que "os brasileiros nunca protestam por nada".

Ela acrescentou que o marido era uma pessoa estudiosa, caseira, que gostava de ler, além de dedicar-se à ecologia:

- Ele queria fazer um blog sobre meio ambiente, mas não deu tempo.

O secretário do Meio Ambiente de Rio Claro, Mario Vidigal, lembrou que ele era um idealista da causa ambiental, denunciando toda ilegalidade que via.
 
O ecologista foi atingido pelas costas com um tiro na cabeça, quando chegava em seu sítio, depois de levar a mulher até a rodoviária, onde ela embarcou para a cidade do Rio, na qual trabalhava durante a semana. Ela regressava aos finais de semana para encontrar o marido. O corpo só foi encontrado na terça-feira pela manhã, coberto por pedregulhos e folhas de bananeira, num riacho próximo. De sua casa foram levados o laptop, duas lanternas e o celular, informa O Globo**. Conforme a reportagem, Hernández participava do programa Produtores de Água e Floresta, uma parceria do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) com o Instituto Terra de Preservação Ambiental, a prefeitura de Rio Claro e a ONG The Nature Conservancy. Ele recebia uma compensação financeira pelo zelo ambiental. O homicídio está sendo investigado pelas autoridades.
 
A violência inaceitável e revoltante nos remete a um Brasil em que existe um abismo entre o elevado poder dos criminosos e a baixa capacidade do Estado em fazer valer a lei. As pessoas de bem, que respeitam regras de convivência e procuram fazer algo pelo coletivo e pela natureza (como Hernández), vivem à margem de proteção. Dominam a cena os bandidos, os malfeitores, os corruptos e corruptores, os violadores da ordem jurídica, que atuam com desenvoltura, sem nenhum limite, porque falta Estado para fazer respeitar a lei.

Os agentes que combatem a criminalidade se defrontam com a falta de recursos para exercer seu papel, com poucos meios materiais e humanos, muitas vezes sem mínimas condições de trabalho. Os salários pagos pelo Estado a esses homens e mulheres não condizem com a importância e o risco de sua missão.
 
Infelizmente, há muito o Brasil deixou de ser um País cordial e pacífico (se é que realmente algum dia o foi). O que vemos é um quadro crescente e assustador de violência, que radica na maior de todas elas, a corrupção.

A incompetência governamental, em níveis federal, estadual e municipal, em áreas essenciais como segurança, saúde, educação, transporte, infraestrutura, meio ambiente e outras, se acentua a cada dia. Com poucas exceções, a maior parte dos administradores públicos subestima a capacidade de indignação da população diante dessa situação, o que põe em risco as conquistas democráticas.

A terrível morte de Hernández é mais um dado nessa realidade brutal, que é a negação dos direitos humanos, da democracia e do estado de direito pelos quais tanto se lutou e tantos perderam, e continuam a perder, a vida.

Quantos outros ambientalistas estarão sofrendo ameaças e agressões neste momento pelo país afora, sem que nada seja feito? Triste Brasil.
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*El País:
**O Globo: