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terça-feira, 19 de agosto de 2014

Somos os que estão por aí

Jorge Adelar Finatto
 
photo: j.finatto
 
O mundo é um hospício sem muro. Estão todos soltos. A loucura é herança bem dividida entre os humanos. As partilhas registradas nos cartórios do desassossego.

A pessoa precisa ter reservas de luz pra suportar tanta escuridão.

Somos os que estão por aí. Os por enquanto. A gente mói e é moído. O que acha? O moinho triste da vida. Tem vivente que passa a existência sem receber um afago, um ora-veja. Os que. Pra eles não existe vem-aqui-meu-bem-me-dá-cá-um-beijinho. Só pedras, perdas.

Os esquecidos jazem no fundão do abismo. O mundo não presta atenção nos sem-afeto. Os outros, a turma dos contentes, dos bem amados, quando muito vivem pra si. Os que se acham. As almas leves. Corações secos.

O moinho pesado gira no esconso. Caminho de sombras.

Às vezes um resolve resilir o contrato com o eterno. Quase ninguém nota o último ato do infeliz. Nenhuma flor se colhe em sua difícil memória. Nenhum pensamento, nenhuma ternura. As indiferenças. Os giros insensíveis da roda de fazer pó e esquecimento.

Assim se afunda o coração dos bonecos de ventríloco.

Viver são uns suspiros, uns carinhos desaparecidos.

Alguns poucos levam a lanterna na mão. Esses, ao menos, ainda choram, se comovem, não se conformam, lutam, amam. Fazem os caminhos.
 
Por eles a aurora tece os fios rosados da manhã.

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Texto revisto, publicado antes em 13 de abril, 2010.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

O que vale na escuridão

Jorge Adelar Finatto

photo: j.finatto

 
Os gestos são os melhores professores, os mais autênticos, os que verdadeiramente podem ensinar algo de bom (ou mau) a alguém. Se queremos transmitir valores nos quais acreditamos, precisamos antes dar o exemplo.
 
Um gesto vale, não diria mil, mas um milhão de palavras. Palavras são feitas de ar e delas se ocupa o vento, levando-as. O que importa é o que se faz de concreto com as palavras que brotam sem parar da nossa boca. A teoria, isoladamente, não leva a lugar nenhum.
 
Nessas lucubrações não há nenhuma novidade. É assunto batido, velho (sempre atual embora), que mereceu inclusive tratamento na Bíblia.

Ouçamos o que diz Tiago, irmão de Cristo, na sua Carta: "Vedes que o homem há de ser declarado justo por obras e não apenas pela fé." E ainda: "Deveras, assim como o corpo sem espírito está morto, assim também a fé sem obras está morta." (A Carta de Tiago, capítulo 2, versículos 24 e 26).

Lembro essas coisas ao constatar (todos os dias, todos os lugares) o quanto estamos carentes de atitudes de bondade e civilidade, no dia a dia, nos relacionamentos, na rua, no trânsito, no trabalho, no interior das casas.

O quanto nos falta esse ato capaz de nos tornar mais humanos, mais fraternos, mais solidários, menos julgadores, mais em paz com o outro.

Chego sempre à invariável conclusão de que temos tudo para dar certo como pessoas, fazendo do mundo um lugar mais feliz, mas falta este passo que nos tornará melhores do que somos.

Nunca esqueço, a propósito, o ensinamento de Santo Agostinho, que certa vez ouvi, e que contém uma verdade pulsante como o sol:

"Os maus não são bons porque os bons não são melhores."

Como a maioria das pessoas, estou farto de tanta violência, de ver o sofrimento, a indiferença e o egoísmo tomarem conta.

O que vale é saber quem de nós vai acender a vela, o farol, a lanterna, o archote, a lâmpada para dissipar essa escuridão que nos cerca e que já vai longe demais.

É preciso se iluminar urgentemente.