domingo, 16 de março de 2025

Quinquilharias do Adelar

                                          Jorge Finatto


photo: Clara Finatto, 16.03.25

                                                                                                                          

Jogo de damas

O vento sopra entre as paredes da tapera. As janelas batem sobre o horizonte vazio. As xícaras de latinha entornam silêncio. Os fantasmas jogam damas no telhado. O esquecimento devora tudo. A vida é amargamente engraçada.

 

Mas em que mundo tu vive*

José Falero é um escritor que me entusiasma. O que não é pouco já que estou meio que largando o hábito de monge da literatura. O que me interessa é a escrita.  Falero tem idade de novo (38) e uma escrita que o coloca entre os melhores que tenho lido. Um texto que faz bem porque fala direto ao coração e à consciência com simplicidade joão-gilbertiana. Não rende tributo a intelectualismos ocos nem sintaxes asfixiantes. Traz a palavra nascida do mais profundo cotidiano. Antirracista, irônico, duro, humano, sem esquecer a alegria e a poesia da vida. Trabalhou como auxiliar de pedreiro, funcionário de supermercado, porteiro de edifício, palhaço em peça de teatro, toca cavaquinho, entre outras ocupações. Mas creio que o ofício que mais lhe cai bem é mesmo o de escritor, porque fala por ele e por muita outra gente que não tem voz nem vez. Escrevendo assim, estimula a que muitos escrevam também. E delicia quem ama a boa palavra nos livros.

*Crônicas de José Falero, Editora Todavia, 2021.

 

Aurelião

Durante alguns anos fui revisor de livros, profissão essencial e pouco valorizada. Sempre trabalhei com obras de consulta. Entre elas, aquela a que mais me afeiçoei foi o Aurelião, companheiro de infindáveis horas fechado em salas inóspitas. Ao percorrer caminhos do léxico muitas vezes encontrei palavras-viagem, e nelas viajei muito além das solitárias quatro paredes.

 

Outono

O outono chega na semana que agora entra. Caminhando, vou ler o que dizem as folhas amareladas. A bananeira lá de casa me lembra amorosamente o poeta Matsuo Bashô. Porque se parece com ele. Bom outono a todos.