quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

A fera escondida

Jorge Adelar Finatto
 
beira do Guaíba. photo: jfinatto
 
 
Os dias escapam sem trégua. Passam como o vento entre as folhas do calendário.

O tempo é água escorrendo de um balde cheio de furos, foge por todos os lados e buracos. Sai pelos ouvidos, olhos, narinas, barba, memória.
 
O tempo é a fera escondida na penumbra da nossa passagem. Ataca em silêncio e sem pena. É preciso aprisionar o tempo numa alta torre e jogar a chave no fundo do poço. Quem há de?
 
O tempo é um devorador insaciável de dias, meses, anos, corações. Leva de cambulhada nosso ser e nosso sangue. Suga feito um verme invisível e nefasta é sua sede.

A vida é um doce que a gente vai comendo pelas beiradas do prato, devagarinho, já sentindo tristeza, porque sabe que vai acabar. É a melhor iguaria que alguém inventou.
 
Procurei no Aurélio a definição do tempo para, conhecendo-o melhor, poder dominá-lo e, quem sabe, desligar todos os seus relógios e silenciar os miseráveis tic-tacs.

Diz o verbete: Do latim tempus. A sucessão dos anos, dos dias, das horas, etc., que envolve, para o homem, a noção de presente, passado e futuro.
 
Palavras, só palavras. Que podem diante do moinho perverso das horas? A natureza do tempo permanece mistério. O que sei é que é carnívoro.
 
Será quimera, será sombra, o tempo? Será um sonho que alguém sonha? Seremos personagens que um autor criou numa hora de fastio diante do eterno?
 
Que relógio mede o tempo do tempo? Que porcaria é essa?

Que grande desperdício de vida, que hora medonha entre nascimento e morte. Quem tem a chave do umbigo deste abismo? Palavra, palavras, que podem, que podemos?

O tempo corrói tudo. Não tem dó. Não tá nem aí. É fábrica de despedidas.
 
Ferida aberta sob o sol. Nunca cicatriza. 
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Basta a cada dia o seu próprio mal.
Mateus 6:34