Jorge Adelar Finatto
Diziam os antigos que cada pessoa tem o seu anjo da guarda. Anjo bondoso e santo que vela o sono, releva os erros, protege dos perigos, aconselha, sabe perdoar. Anjo zeloso e protetor que anima o coração desolado, guarda e ajuda a viver.
Não sei se os anjos ainda estão por aqui, tal o estado que os homens deixaram o mundo. Se pudesse fazer um pedido, pedia ao meu anjo da guarda que inventasse depressa a máquina de desmorrer.
Sim, para acabar com o problema do desnascimento que todos os homens e mulheres carregam dentro de si e dele não conseguem se livrar. Porque desnascer, ou deixar de andar sob o sol, é coisa das mais tristes, sem nenhum sentido, um desperdício enorme de tempo, esforço, sonhos e sentimento.
Uma vez expulso o desnascer de nossas vidas, com a eternidade toda pela frente, quanta coisa bonita haveríamos de fazer e conhecer! Teríamos os dias necessários para consertar o que ficou torto, o que não deu certo.
Vou fazer muitos barcos de papel para soltar no Arroio Tega, nas manhãs da eternidade. Passearei com meu guarda-chuva nas ruas molhadas e vazias de Passo dos Ausentes. Subirei na perna de pau na Noite de São João, olharei a Lua da janela do meu quarto de menino, pescarei estrelas com o chapéu.
Descobrirei o nome de todas as flores e árvores. Pedirei, também, ao meu anjo protetor que traga de volta, sem mais demora, os seres amados que já partiram. Sim, estou cansado de viver longe deles, sinto muitas saudades.
Quero todos os ausentes por perto outra vez. Principalmente nessas solitárias noites tão frias, tão povoadas de neblina e memória. O banzo que isto dá na gente.
Os invisíveis habitam o coração do outono.