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terça-feira, 25 de setembro de 2018

O barco mais triste do mundo

Jorge Finatto
 
Coimbra e o pequeno cais. photo: jfinatto

A MINHA PAIXÃO por barcos e navegações sempre me leva a cidades de mar ou rio. Sou um bicho das águas. O fato de ter nascido, e de ter voltado a viver, depois de muitos séculos, numa cidade serrana é apenas uma das contradições que me definem.
O sonho menino de ser marinheiro nunca me abandonou. Contudo, não vesti a farda azul-marinho. Em contrapartida, conheço o suspiro das cordas que seguram os navios no cais.
Em Coimbra, existe um barco de passageiros com o nome de Basófias, fundeado no pequeno cais, perto do centrinho da cidade portuguesa que possui uma das mais vetustas universidades da Europa.
Resolvi, em três ocasiões, em diferentes anos, ir ao encontro do Basófias e fazer um passeio pelo Mondego, o belo rio que me faz sentir saudade do Guaíba quando estou por lá. Ocorre que em nenhuma delas consegui realizar a navegação.
Numa das vezes, o barco estava em manutenção; noutra, não havia passageiros além de mim; numa outra ainda, o tempo mau do inverno não permitiu levantar âncora.
A tripulação do Basófias é composta por marinheiros uniformizados a rigor, afáveis no trato. A pose e o orgulho náuticos não deixam dúvida de que estamos, possivelmente, diante de calejados navegadores.
O Basófias, porém, permaneceu no meu imaginário como um barco que jamais saiu do cais.
Às vezes, fico pensando nas minhas vãs tentativas com o Basófias. Nas amarras que o impedem de lançar-se ao Mondego e cumprir o destino para o qual nasceu. É talvez o barco mais triste do mundo.
De certa forma, o Basófias é a metáfora da existência de muitos. Tantas vidas que ficam à margem, esperando no cais, esperando uma viagem que nunca acontecerá.
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Texto revisto, publicado antes em 03 de março, 2010.

domingo, 21 de setembro de 2014

Receita para velhos

Jorge Adelar Finatto

photo: j.finatto
 
Enquanto tomava um cappuccino no café da livraria, folheando um livro, duas jovens sentaram à mesa ao lado e começaram a conversar. Ouvi a seguinte passagem, não por abelhudo, mas porque o som da conversa invadiu sem cerimônia o meu espaço aéreo. 
 
- As minhas duas velhas tias estavam desanimadas quando as visitei um dia desses, na casa onde moram, que não fica longe do meu apartamento. Falavam mal da idade, dos problemas de saúde, da voragem do tempo que tudo devora.
 
- Ai, que triste!
 
- Mas aí eu disse: vocês têm que ver as coisas boas que podem fazer: ler livros, viajar, sentar na varanda.
 
Eu, que estou sempre aprendendo, principalmente com os mais moços, guardei o conselho que poderá ser muito útil quando eu ficar velho qualquer dia.

Não sei exatamente o que vou fazer com a parte de sentar na varanda. Mas pela convicção com que a moça falou, deve haver algum consolo e uma insuspeitada alegria nisso.