segunda-feira, 23 de maio de 2011

Seco

Jorge Adelar Finatto



photo: j.finatto
 
Coração seco, boca seca, mão seca. Secas palavras, medo seco. Secas pétalas de camélia vermelha dispersas no chão da praça. Seco, seco.
 
Secos pássaros dormem em ressequidos galhos. Secas folhas de plátano se agitam contra o azul. Manhã silenciosa, bailarina morta na caixa de música, enferrujado relógio de parede, tudo seco.
 
Secou a ponte que unia os amantes, inundava-os com a urgente carícia. Secaram as velas das faluas do Tejo.

Os olhos que olhavam o pôr-do-sol no Guaíba secaram, secaram.
 
Secos homens invadiram as ruas secas da cidade, cometeram tristes barbaridades.
 
O milharal, de tão seco, pegou fogo.
 
Sentimento e pensamento, secos. O sexo ficou seco. As páginas do livro de poemas por escrever, secas, secas.

Seco olhar observa do fundo do espelho.
 
A ternura, a ternura, um rio seco, seco dentro do coração.