quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Um conto chinês

Jorge Adelar Finatto



Mais uma vez um filme argentino me tira de casa. Desta vez foi Um conto chinês, que tem no papel central esse grande ator que é Ricardo Darín (O filho da noiva, O clube da lua, O segredo dos seus olhos). A presença de Darín é motivo justo e esperado para esse movimento tão antigo quanto civilizado que é sair da caverna para ir ao cinema.

A Argentina faz hoje os melhores filmes do mundo, no meu mui modesto entendimento. Cinéfilos e cineastas devem prestar atenção no que os irmãos que habitam as margens do Rio da Prata estão fazendo na tela. Em menor proporção, mas com a mesma qualidade, estão obras produzidas no Uruguai (O banheiro do papa, entre outras).

Roberto (Darín) é um homem solteiro, na faixa dos 40 anos, que vive um cotidiano solitário e paralisante na sua casa num subúrbio de Buenos Aires, que tem na parte da frente uma ferragem, que administra e da qual é proprietário. É ex-combatente da guerra das Malvinas. Além do trabalho, tem como passatempo procurar e colecionar recortes de notícias absurdas. Um homem ensimesmado, desconfiado, mergulhado na sua pequena vida. Um de nós, em suma.

Um dia conhece Jun, um jovem chinês que veio embarcado, trabalhando num navio mercante, para a Argentina em busca do tio. Um acontecimento os aproxima, levando-os a conviver, apesar de um não entender o idioma e a vida do outro. Roberto vê sua rotina ser invadida contra sua vontade. Abriga o rapaz perdido, o que o leva a experimentar gestos e sentimentos até então desconhecidos. A vida não seria mais a mesma.

Um evento real, ocorrido na China, está na origem da narrativa: uma vaca que caiu do céu.

O filme conta uma boa história, tem bom roteiro, uma câmara simples e correta. É povoado de diversas situações que levam o espectador ao riso, à reflexão sobre a solidão e a solidariedade. Nos coloca diante da fragilidade da existência e dos desígnios humanos, tendo como pano de fundo a única coisa capaz de nos salvar da dureza da realidade, dos outros e de nós mesmos: o amor.

O sentimento que a gente leva depois que sai da sala escura é de que, apesar de tudo, vale a pena estar vivo emocionalmente, em meio ao nada que nos cerca.

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Produção: Espanha e Argentina, 2011. Direção de Sebastian Borensztein. Com Ricardo Darín, Muriel Santa Ana, Huang Sheng Huang, Javier Pinto, Julia Castelló Agulló. 93 min.
Imagem: cartaz do filme.