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sexta-feira, 22 de julho de 2016

Caderno de Abrantes

Jorge Finatto

desenho de Abrantes. Eduardo Salavisa
 
Tratei aqui no blog dos diários gráficos ao abordar trabalhos de Mário Linhares¹ e Eduardo Salavisa², ambos portugueses. Aprecio esses desenhos que captam instantâneos do cotidiano, em pequenos cadernos que os desenhadores levam na mão, no bolso, na bolsa, na mochila, na bicicleta, dentro do chapéu, etc.

Há qualquer coisa de frescura, de fruto recém colhido do pomar cuja imagem surge leve na página e logo conquista a intimidade do leitor.

Para esses desenhadores, desenhar é uma forma de entrar em contato com o mundo, desvelar um momento que, de outro modo, se perderia no relâmpago do instante. São traços que nascem da observação distraidamente atenta do entorno.  Há desenhadores em diversos países, mas no Brasil creio que o gênero ainda é pouco cultivado.

A arte - o desenho é uma de suas faces - responde a um apelo de registrar o efêmero. Os desenhos assim concebidos não têm a objetividade como alvo. Trata-se, antes, de uma visão bastante pessoal e livre do observador. É muito mais um sentimento do que um retrato. Neste olhar particular estão a riqueza e a surpresa das imagens.

O itinerário através do cotidiano é algo que diz muito. Revela uma capacidade de se deixar tocar pela realidade dos lugares e das pessoas que neles habitam. Isto não é pouca coisa, considerando o momento extremamente duro e violento que vivemos, em nível global, com grandes tragédias invadindo as ruas e cerceando nossos passos.

desenho de Abrantes. Eduardo Salavisa

Acabo de receber pelo correio - ainda com cheiro de Portugal - o livro Caderno de Abrantes³, de Eduardo Salavisa. Natural de Lisboa, onde vive e trabalha, Eduardo costuma desenhar em qualquer lugar e circunstância. É autor e organizador de vários livros do gênero, além de participar de exposições, conferências, cursos e encontros enfocando esse tipo de trabalho.

O Caderno de Abrantes resulta de uma residência artística que ele fez naquela cidade em  2015, durante 11 dias. Nesse período perambulou pelas ruas, praças e diversos ambientes, vendo e convivendo com as pessoas naquele universo.

Diz o autor na apresentação: "Quando me convidaram para desenhar Abrantes, cidade onde nunca tinha estado mais que umas horas, pensei: Será que conhecem os meus desenhos? Que sabem que tipo de desenho faço? Saberão que os meus registos não são completamente fidedignos ao observado?... Sabiam e a liberdade era total".

A obra de Eduardo é reveladora não só de recantos de Abrantes como de momentos da vida de seus habitantes. Em formato de livro de bolso, desperta no leitor o desejo de conhecer aqueles cenários. A variedade das cores e das formas é um regalo para os olhos.

Difícil imaginar maneira mais delicada de mostrar uma cidade.

desenho de Abrantes. Eduardo Salavisa
___________

¹Fernando Pessoa viajando no elétrico em Lisboa:
http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/2016/02/fernando-pessoa-viajando-no-eletrico-em.html  

²Eduardo Salavisa e a viagem no cotidiano:
http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/2014/11/eduardo-salavisa-e-viagem-no-quotidiano.html

³Caderno de Abrantes. Eduardo Salavisa. Edição da Câmara Municipal de Abrantes. Portugal, 2016.
 

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Fernando Pessoa viajando no elétrico em Lisboa

Jorge Finatto
 
pintura: Mário Linhares. foto com celular: jfinatto
 

Estive revisitando o Museu Nacional dos Coches, em Lisboa (fui lá pela primeira vez em 2002), sempre um programa interessante. São carruagens muito antigas, com exemplares a partir do século XVI em diante. Pelo que li, não existem iguais em nenhum país da Europa. Na França, por exemplo, teriam sido destruídas durante a famosíssima Revolução de 1789.
 
Certos coches são tão formosos que dá vontade de sentar neles e sair rodando pela cidade, como faziam os nobres e prelados daqueles tempos. Existem alguns construídos especialmente para crianças. Não estou a justificar a monarquia nem privilégios (ainda em voga em várias repúblicas atuais). Penso na beleza e técnica construtiva dos objetos em si, produtos da criatividade humana. Numa época em que motores estavam longe, muito longe de existir, e o transporte de tração animal era a regra, andar de coche era uma necessidade e um luxo. Mais adiante publicarei imagens que colhi no local.
 
No mesmo museu, visitei a exposição de pinturas do artista português Mário Linhares, as mesmas que ilustram o livro de Fernando Pessoa intitulado Lisboa, o que o turista deve ver. São desenhos de fino traço e sensibilidade, dignos de figurar na obra do genial poeta que Portugal deu ao mundo.
 
Dois ou três dias depois, estava no agradável Café Lisboa, no Teatro Nacional de São Carlos (situado no largo com o mesmo nome, onde nasceu, aliás, Fernando Pessoa, no quarto andar de um edifício situado no lado oposto ao teatro), quando, ao manusear o cardápio, me chamou a atenção a pintura na capa e contracapa, que ilustra este post (e a capa do blog nesta data). De quem era? Mário Linhares. A foto (feita com o celular) saiu meio sombreada.
 
Gostei tanto que enviei um e-mail ao artista solicitando autorização para publicar aqui no blog (ele gentilmente atendeu o pedido). Retrata Pessoa viajando na porta de um elétrico, observando a cidade que tanto amou/amamos. Um momento precioso. Ao Mário, cumprimentos pelo trabalho e um abraço agradecido.
 
pintura de Mário Linhares na contracapa.
em cima, poema de Fernando Pessoa