terça-feira, 7 de maio de 2013

A casa do anjo

Jorge Adelar Finatto
 

photo: j.finatto. Colonia del Sacramento. Uruguai
 

Antes de começar a chover esta noite, arredaram uns móveis bem pesados lá no céu. Um barulho espesso e arrastado de trovões me fez pensar que era a mudança de um anjo.

Um anjo bom e humano com invisíveis asas de plumas perfumadas, levando com ele seu chapéu, suas estantes de livros, sua bicicleta e outros objetos pessoais.

Um anjo, quando se muda, deve ter muita coisa pra carregar: cartapácios com registros e fotografias de quem ele protege, cadernos de milagres, álbuns de recordações de pessoas que acompanhou um dia, armário onde guarda instrumentos do ofício, um piano, aquarelas com os campos do Senhor.

As roupas e as botas do anjo devem ser brancas como nuvem.

Gostava que o meu anjo da guarda viesse morar mais perto de mim.

Meu coração anda necessitado de amigo com sabedoria e consolação. Ele podia até ficar morando aqui em casa. Quando quisesse olhar o mundo pra ver como vão as coisas, podia subir no telhado e ficar perto da chaminé, lugar calmo e iluminado, de onde se tem uma boa vista.

O meu anjo da guarda. Há de expulsar a solidão que toma assento na sala. E nunca mais nenhum mal vai me acontecer.

Quando de noite o medo se acercar de mim, o anjo me dará sua mão forte. Então eu dormirei como um menino. E vou sonhar outra vez.

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Texto revisto, publicado originalmente em 10 de dezembro, 2010.