Jorge Adelar Finatto
photos: j.finatto
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A caminhada polifônica destina-se não apenas ao exercício do corpo como à indispensável atenção às coisas do espírito.
A observação dos seres vivos e da paisagem, a aproximação estética e sensorial da mãe natureza, a respiração do ar limpo e fresco das manhãs e tardes, a descoberta de inefáveis epifanias durante o percurso, tudo isso faz parte da polifonia andante.
Caminhava eu, pois, nas cercanias do Lago da Neblina, em Passo dos Ausentes, em andança de paz e contemplação, prevenido com a invencível Coruja, a vetusta máquina fotográfica que me acompanha.
Os gansos, insolentes, desistiram de acusar a minha presença. Concluíram após breves instantes que sou apenas um andarilho que está só de passagem, um sujeito inofensivo, sem nenhuma importância na ordem cósmica, um sopro, como se diz, na ventania, que perambula a bordo de um chapéu de palha branco, levando grossas e estapafúrdias lentes nos óculos, à cata do invisível.
Um indivíduo assim não oferece risco à fauna nem à flora, quiçá a si mesmo.
Um indivíduo assim não oferece risco à fauna nem à flora, quiçá a si mesmo.
Andava, portanto, em pleno dia, como quem persegue uma estrela cadente.
Nas margens e dentro do lago existe vida pulsante. Estava olhando o vazio (essa maneira de encontrar, talvez, o inesperado), quando ouvi um vago rumor na água no meu esquerdo lado (a bombordo, como nós, marinheiros do universo, costumamos de dizer).
Um peixe branco, a boca pintada de vermelho, com traços coloridos espalhados pelo corpo, cerca de 1 metro de comprimento. Passou a simpática criatura a navegar perto de mim.
Tive a impressão de que sabia da sessão de photos, ao menos não poupou poses e movimentos. Chegou-se mais para a beira, tornou-se mais íntimo, mas não tão próximo que não pudesse executar um plano emergencial de fuga caso isso fosse necessário. Não foi.
Acho que ele quis dizer alguma coisa com sua esguia, calma e querida presença, e acho que conseguiu.
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Texto revisto e atualizado, publicado em 25 de janeiro, 2011.