quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

La donna è cieca, lei vede tutto

Jorge Finatto
 
 

A MULHER é cega, ela vê tudo. Com visão diferente: se o mundo das aparências lhe foge, ela toca o chão com a bengala e apalpa os corpos e objetos para decifrá-los. Contudo, o mundo abissal dos corações lhe é familiar. Ela transita pela intimidade das coisas.

Estou falando de Emma, personagem do belo filme italiano A cor escondida das coisas (Il colore nascosto delle cose), que no Brasil levou o título Emma e as cores da vida, de 2017, dirigido por Silvio Soldini. Com excelentes desempenhos de Valeria Golino (Emma) e Adriano Giannini (Teo).

Nada é fácil na vida de Emma. A duras penas teve de orientar-se no mundo sem luz, desde que, ainda menina, perdeu a visão. Habitou grandes soledades, desenvolveu com paciência e obstinação a ciência de resolver-se sozinha. Multiplicou-se em intuição e percepção. É osteopata de ofício.

Teo e Emma

Mas é sobretudo vidente, do tipo que vê com o cérebro e com o coração. Sim, desse tipo de gente de que o planeta está quase vazio. Por estar aberta ao encontro e ao amor, acaba por encontrá-lo. Justo no seu caso.

Comovente ver sua disposição em direção à amizade, ao afeto, à beleza, sem coitadismo. Ela quer, mas sem desespero, sem que o outro entre na sua vida e faça o que bem quiser. Ela quer, ela pode ser independente contra todas as dificuldades que sua condição impõe.

Com simplicidade e sabedoria, Emma abre portas e janelas na escuridão de todos os dias. Para si e para os outros.