sexta-feira, 15 de junho de 2018

A fábrica do esquecimento

Jorge Finatto

máquina antiga. Livraria Miragem, São Francisco de Paula

 
OLHO a velha fotografia. Estou batendo nas teclas da máquina de escrever na redação do jornal Folha da Tarde, de Porto Alegre, que existiu entre 1936 e 1984. O ano é 1982. Trabalho na dura lida de repórter. Eu acreditava então que teria um futuro no jornalismo, porque gostava de ler, escrever e buscar a verdade das coisas. Meu sonho era trabalhar com jornalismo cultural.
 
Vinte e alguns anos, pai de filho, pagando aluguel e tudo mais, salário baixo. A luta de sempre. Algum tempo depois, não vendo perspectiva na profissão, mudei o rumo do meu barco e fui para o Direito.

Naquele momento minha luta era sair da pobreza que me acompanhava desde sempre. Concluíra a Faculdade de Comunicação Social na PUC a duras penas. Nela conheci o ser humano admirável, professor e grande jornalista que foi Antoninho Gonzalez, que me estimulou e ajudou muito a conseguir este primeiro trabalho em jornal.
 
Novo no ofício, aprendi que a matéria com que se lida numa redação é o efêmero. Um jornal é feito para ser esquecido. Terá sorte se for lembrado por estudiosos no futuro. No entanto, quanto esforço é preciso para fazer um bom jornal!

Quantos bons profissionais, quanto talento, quanta luta, quanta renúncia são necessários para construir as páginas do esquecimento! 
 
O Brasil é o que é com a imprensa livre das últimas três décadas. Se você acha que estamos muito mal como nação (de fato estamos), imagine como seria sem a imprensa a esquadrinhar e divulgar os podres que muitos querem esconder na sombra.
 
Eu me vejo jovem e inteiro na antiga foto. Vivo. Acreditando no poder da palavra para mudar a realidade e melhorar a vida de todos. Uma bela luta. Tudo valeu a pena. Cada linha, cada parágrafo que escrevi nos breves anos de repórter.

(Como leitor, sou grato a todos os jornais e revistas lidos à procura de um novo olhar, verdade e beleza.)