quarta-feira, 2 de setembro de 2015

No tempo das pandorgas

Jorge Adelar Finatto
 
photo: jfinatto

 
Na rua São João, a pandorga simbolizava nossa sede de infinito. Carregava nossa imaginação, nossos sonhos, nosso gosto pela liberdade, o desejo de ir além. 

No tempo das pandorgas, andávamos lá no alto, o coração pulsando ao vento. O resto não importava.

Uma das chateações da minha meninice era não conseguir construir e soltar pandorgas. Os meninos do bairro eram bons engenheiros e pilotos dessas coisas que voam. A época ideal de soltar pandorgas devia ser o início da primavera, mas não estou certo.
 
Eu pilotava as pandorgas dos amigos, quando emprestavam. Passei pelo vexame de derrubar várias delas. Mas o primo Rogério me consolava: - Quem nunca emborcou uma pandorga?
 
Em compensação, soltei muitos guarda-chuvas em dias de ventania nos Campos de Cima do Esquecimento. Nunca soube onde foram parar. Sempre fui amigo dos pássaros, esses seres que, como os chapéus de chuva e as pandorgas, também voam. Nem pensar em gaiolas. Observando-os, tornei-me cativo de seu canto, suas cores, seus voos. 
 
Caminhei hoje pelo córrego, pisando seixos, à procura de peixinhos coloridos pra fotografar e restos de estrelas cadentes. Uma mochila nas costas, a estrada de terra, os perfumes da primavera que se acerca em setembro. Quem resistir pode?