domingo, 9 de agosto de 2015

A sombra da esfinge

Jorge Adelar Finatto
 
photo: jfinatto
 

Como ele nunca teve pai para amar, sempre lhe pareceu que a coisa mais em falta no mundo não é dinheiro, nem ouro, nem diamante, nem qualquer outra coisa, mas um abraço de pai.

Quando menino, era difícil explicar aquela ausência para os outros de sua idade. Na rua e na escola, as pessoas faziam perguntas, cara de admiração. Não ter pai era mesmo que não ter um braço ou uma perna.

A sombra da esfinge o perseguiu pela vida. No dia dos pais, aniversários, natais, páscoas, reuniões da escola, fins de semana, noites e dias sem fim. A falta projetou-se nos seus sonhos e pesadelos.

Um dia descobriu, admirado, que muitas outras casas não tinham também a figura ausente. Só que muita gente escondia isso. Estranho: escondiam um ser que na realidade não existia. Ocultavam o mito. Alguns possuíam apenas uma deprimente figura paterna, que mais atrapalha que ajuda.

Os sem pai já não eram exceção. Talvez fossem até maioria.

Ficou nele a idéia de que as mulheres, e não os homens, fazem o mundo funcionar. São pais e mães de seus filhos.

Na verdade não chegava a ser um consolo, mas a consciência de uma espécie de mutilação social. Sim, falta o pai afetivo em grande parte das famílias brasileiras. Às vezes, ele existe, mas é como se não existisse.

Por essas e por outras, uma parte da humanidade é toda seqüelada, ele pensava enquanto caminhava com o filho pela mão, na praça do bairro, na tarde de domingo.
 
Pra ele, agora, todo dia é dia dos pais.
 
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Texto revisto, publicado em 16 de maio, 2013.