sexta-feira, 2 de agosto de 2013

O retorno do pássaro

Jorge Adelar Finatto

photo: j.finatto
 

Eu andava sorumbático e não sabia por quê. Até que me dei conta: estou longe de Passo dos Ausentes há muito tempo. Porto Alegre, pra mim, não é mais um porto acolhedor, é um lugar onde venho cumprir compromissos. E sinto medo.

Há violência, ressentimento, indiferença demais nesse porto que ficou triste.

Quando estou por aqui, uma vez cumprida a obrigação, fico no apartamento, ou então me refugio em sala de cinema, livraria, café. Pouco saio nas ruas.

O que houve entre mim e Porto Alegre? Mudamos, talvez não nos reconheçamos mais como antes. Perdemos a intimidade.

Se ainda sinto amor pela cidade do pôr-do-sol? Como não sentiria? Afinal aqui cheguei num longínquo abril, depois de escorregar entre os pinheiros e as montanhas, durante um grande vendaval. Vim rolando feito seixo que acabou caindo na beira do Guaíba.

O Guaíba foi o irmão que me recebeu de braços abertos.

Muitos anos depois retornei à serra ancestral, reencontrei o lar perdido. Tornei-me outra vez aquilo que nunca deixei de ser, um interiorano. Por isso essa sensação de passarinho caído fora do ninho quando estou longe da casa de madeira e basalto nos Campos de Cima do Esquecimento.

Em suma, parafraseando o velho Sócrates, eu não sei de nada, mas sei menos ainda da vida e de mim quando estou na cidade grande.

Quando você ler estas maltraçadas linhas, raro leitor, eu estarei na estrada, regressando, enfim, pro meu canto no universo. Feliz como pássaro ferido que retomou o vôo.