quarta-feira, 22 de junho de 2011

Passos de algodão


Jorge Adelar Finatto
Photo: J. Finatto

Amar traz consigo, sempre presente, o risco de perder.

Depois de longa e sentida ausência, ele retornou ao convívio das tardes no escritório. Conheço meu amigo de outros invernos. Partiu em fevereiro sem dizer nada, tão ao seu estilo, e me deixou aqui todo esse tempo sem poder ouvir sua voz cava e rascante, sem poder ver sua plumagem luminosa, seus olhos redondos e atentos.

Sempre sinto falta do seu olhar de banda, da maneira estrambótica de aterrissar num só pé na sacada do escritório. Alziro tem temperamento forte e, às vezes, um certo mau humor o acompanha quando o tempo está pra chuva.

Ele voltou com suas cores vivas para suavizar o inverno. Eu andava mesmo precisado de sua companhia. Não que ele converse muito. No fundo, nem é isso o mais importante.

A silenciosa presença do amigo, sabê-lo perto, partilhando a vida, é motivo de consolo e esperança.

Providenciei hoje a reposição de pedaços de banana no pratinho dos pássaros, fruto muito do seu gosto.

Em certos dias, Alziro deixa a cerimônia de lado, entra no escritório, em passos de algodão, e ensaia uma pequena incursão no ambiente. Olha o teto, os lustres, a mesa, os livros, os quadros, as plantas e relógios, tudo com silenciosa atenção. Faço que não percebo para deixá-lo à vontade.

Do mesmo jeito que chega, o meu amigo vai embora. Como sempre, não se despede e nem diz quando voltará, apenas alça o improvável voo adunco rasgando o ar.

O que importa, diz o coração, é que a velha e boa amizade está rediviva. Se tudo der certo, talvez ele retorne amanhã ou quem sabe depois. Só espero que não me falte tão cedo, porque meu inventário de ausências já vai longo na vida.

Amar traz consigo, sempre presente, o risco de perder.

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Foto: J. Finatto. Alziro em visita.

11 comentários:

  1. Poeta, não é somente o que escreve.
    É aquele que sente a poesia, se extasia sensível ao achado de uma rima à autenticidade de um verso.
    Cora Coralina

    Parabéns pelo blog...

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  2. Ao abrir o meu computador todos os dias e visitar o seu blog, é como a visita do seu amigo a sua casa. Aquece o meu coração e me lembra que o mundo não é assim tão árido. Obrigado pelo calor e pela cor que você a minha vida.

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  3. Cara Regina,

    ter uma pessoa com a tua sensibilidade como visitante do blog é motivo de alegria, pode acreditar. Fico muito feliz com as tuas palavras. Espero que te sintas em casa por aqui.

    Um grande abraço.

    Jorge

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  4. Caro anônimo(a),

    Tenho uma imensa admiração pela poesia de Cora Coralina, que se tornou poeta conhecida no tarde da vida, a nossa "Aninha".

    Muito obrigado pela lembrança dela e pela tua generosa manifestação.

    Um abraço.

    Jorge

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  5. Por nada Jorge!!

    Abraço!

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  6. Bela companhia, Adelar, com sua indumentária colorida, nas cores irreproduzíveis da Natureza.
    Pois aqui os civilizados, destruiram a sede da AGAPAN, deixando um rastro de barbárie.
    Já disse alguém: "viver na Natureza é viver perto de Deus".

    Abs.

    Ricardo Mainieri

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  7. Ricardo,

    a Agapan foi uma das instituições não-governamentais mais importantes já surgidas no Rio Grande do Sul, pelo que despertou e semeou em termos de pensamento e ações em prol da natureza há quarenta anos.

    É uma lástima que a preocupação com o ambiente, hoje, seja mais retórica do que prática.

    Um abraço.

    JF

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  8. que bom !acessar! emoções em frases e versos emoldurados em fotos artisticas. e reencontrar o colega dos tempos jornalisticos na capital. cumprimentos ecléa berenice (não anônima...)

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  9. Cara Ecléa,

    que bom receber a visita de uma colega do tempo de jornalismo. Lá se vão alguns anos daquele ambiente de trabalho e amizade.

    Muito obrigado pela manifestação.

    É motivo de alegria a tua presença e a tua mensagem.

    Um abraço.

    JF

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  10. É assim que estou me sentido, por isso fique à vontade se eu extrapolar.
    Grande abraco.

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  11. Adelar, trago uma informação sobre seu amigo Alziro. Saibas que aquele grande bico serve de termorregulador - como se fosse o radiador dessas caminhonetes Ling-Ling - além das funções de defesa, alimentação e comunicação visual. É com ele que o bichano se mantém aquecido no inverno e libera calor no verão. Legal né?!

    Um abraço.

    Abraço

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