segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Último dia para ver "Olhar sobre Veneza"

Jorge Finatto

Exposição Olhar sobre Veneza. Café do Porto. photo: jfnatto
 
NESTA SEGUNDA-FEIRA encerra-se a mostra Olhar sobre Veneza no Café do Porto. Foram 14 dias de convívio das imagens com os frequentadores do charmoso café da Rua Padre Chagas.

Estive lá algumas vezes nesse período, olhando as minhas crias e o movimento, sentado à mesa perto da janela. Um bom lugar para se estar, sob a direção atenciosa de Cacaia Bestetti, que, além de arquiteta e proprietária, é incentivadora das artes.
 
Espécie de memorabilia afetiva da cidade do Adriático, a exposição nasceu por acaso, fruto das minhas digressões por seus canais e pontes, a pé ou embarcado. Veneza é um nome bom de se dizer e um lugar único no universo para se conhecer.
 
A todos que estiveram na mostra, meu agradecimento. Uma exposição só faz sentido no olhar de quem a vê. Até a próxima.
 
photo: jfinatto

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

A lupa chinesa

Jorge Finatto

photo: jfinatto
 
 
COMPREI UMA LUPA num bazar perdido num canto do mercado público. A procura de sempre: aumentar a nitidez das coisas. Não é esta a primeira vez, nem a primeira lupa. Esta lupa, contudo - garantiu-me o vendedor -, é especial,

- fui buscá-la no laboratório de um sábio chinês, no bairro do Bixiga, em São Paulo. Instrumento especial  de primeira, sim senhor, capaz de divulgar até o invisível.

Eu ando tão precisado de claridade, tão necessitado de qualquer coisa que me ajude a decifrar os absurdos e mistérios do mundo, que não resisti à oferta, sem opor dúvida nem ressalva. Quem sabe não começo, enfim, a entender melhor o sentido da vida?

Uma dúvida, porém (sempre o maldito porém), me ocorreu. Não sabia que havia sábios chineses criando maravilhas no Bixiga. Que eu saiba, naquele tradicional bairro vivem italianos, seus descendentes e afins, além de nativos. Ao menos era assim quando por lá andei há muito tempo, envolvido com as artes do Grupo Sanguinovo e fazendo visitas ao MASP.

Se há sábio chinês estabelecido no Bixiga é coisa de eras recentes. Mas pode ser também que algum carcamano esteja se fantasiando de chinês (e de sábio) para vender quinquilharias de origem duvidosa. Mas que digo eu? Por que essa mania de duvidar e sopesar os detalhes? Por que não acreditar na humanidade simplesmente?
 
O fato é que agora estou armado com a mágica lupa do sábio chinês do Bixiga. Partirei com ela em expedição aos confins do dia, buscando desvelar enigmas e encontrar clarões em meio à densa treva. Colecionarei as revelações do universo. Sabe lá Deus as besteiras que resultarão...
 

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Città del cuore

Jorge Finatto
 
Veneza. photo: jfinatto
 
Uma cidade será sempre
o que nosso coração
diz que ela é.
 

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Nagai Kafu e as histórias da outra margem

Jorge Finatto
  
Nagai Kafu entre mulheres.
Kafu Nagai with strippers @ Asakusa Rokkuza, 1952
Fonte: the setting sun*
 
  
Oyuki era uma musa que ressuscitara em meu coração tão cansado imagens de um tempo  distante e saudoso. O manuscrito há tanto tempo abandonado sobre a escrivaninha, não fosse por ela ter aberto seu coração para mim - ou, ao menos, não fosse por eu ter achado que esse coração se me abrira -, já estaria há muito tempo no lixo.¹
                      Nagai Kafu
 
MAIS POR FALTA de livros traduzidos do que por outro motivo, no Brasil temos pouco conhecimento da literatura oriental.
 
Mas isso começa a mudar. Na medida em que editoras brasileiras investem na tradução de autores daquele lado do mundo, vamos descobrindo pérolas até aqui escondidas.
 
Ultimamente tenho folheado livros de pintura japonesa, de autores como Hokusai e Hiroshige, e lido textos de escritores japoneses. Não é pouca nem recente a admiração que sinto pela cultura do Japão.
 
Entre os autores daquele país mais conhecidos por aqui, temos Bashô (poesia) e Yasunari Kawabata (prosa, Prêmio Nobel de 1968 ). Mas existem outros de grande qualidade.
 
Acabo de ler Histórias da outra margem, do escritor Nagai Kafu (1879 - 1959), esse da foto com as moças. Trata-se de um livro de 123 páginas, que transita entre a ficção, o diário, a poesia, a crônica e as memórias do autor.

Eu não tinha mais aonde ir. As pessoas que eu queria rever estavam todas mortas.²

Nagai Kafu, 1954. photo de Ihei Kimura**

O enredo se passa na Tóquio da década de 1930. Tadasu Oe é um escritor de quase 60 anos que vive uma história de amor com uma "mulher da vida", na zona de prostituição do bairro Tamanoi, a leste do rio Sumida.

Oyuki é jovem, pobre, bela, alegre, foi gueixa antes de prostituir-se. Ao conhecer Tadasu Oe, pensa abandonar a zona e casar-se com ele. Oe, por seu turno, encontra na jovem inteligente e cheia de vida um cálido cais onde ancora sua solidão nos fins de tarde.

Ao mesmo tempo em que narra o seu romance, Oe conta detalhes do livro que está escrevendo, no qual um professor aposentado abandona a família. O desenvolvimento é surpreendente.

A história é, em vários aspectos, a história do próprio Nagai Kafu. E de muitos homens e mulheres por este mundo afora.

Histórias da outra margem é um livro com uma curiosa e envolvente construção. Nagai Kafu revela-se um excelente escritor, com uma narrativa que combina técnica esmerada e sensibilidade poética, sem cair em literatices.

Como se isso não bastasse, a obra tem ainda belas ilustrações de Shohachi Kimura (1893 - 1958). Um livro, enfim, pra se ter nas mãos.
 
___________________
 
¹,²Histórias da outra margem, pp. 109, 117. Nagai Kafu, Editora Estação Liberdade, São Paulo, 2013. Tradução do japonês e notas por Andrei Cunha.

Texto publicado originalmente no blog em 7 de abril, 2013.

sábado, 7 de janeiro de 2017

Os fascistas

Jorge Finatto
 
photo: j.finatto


Os fascistas
escolhem sempre
as prisões
à BENIGNIDADE DO SOL

mas os poetas
continuarão
VIOLANDO
AS SOMBRAS


 _________________

Do livro O Habitante da Bruma, Editora Mercado Aberto, Porto Alegre, 1998.
 

terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Ponte dei Sospiri

Jorge Finatto
 
photo: jfinatto


Vamos iniciar 2017 atravessando juntos a PONTE DOS SUSPIROS.
 
Mas se houver suspiros na travessia deste tempo que agora começa, que sejam de êxtase, de alegria, jamais de tristeza ou desilusão.

photo: jfinatto

photo: jfinatto

Estão todos convidados a suspirar visitando a exposição OLHAR SOBRE VENEZA, que será inaugurada hoje no Café do Porto.

photo: jfinatto
 

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Colher hibiscos

Jorge Finatto
 
photo: jfinatto 1º jan. 2017

NA TARDE do primeiro dia do ano, saí para colher hibiscos. Colher com os olhos, com a lente esperta da Coruja, ex-máquina fotográfica, quase um ser humano. Nada de arrancar flores para pôr no vaso. O olhar sensível é capaz de entendê-las em seu habitat, sem qualquer ideia de posse.
 
Porque os hibiscos habitam as ruas e praças de Porto Alegre. A sua linda corola é um presente para o coração. Um lenitivo (talvez só o pessoal nascido em meados do século passado saiba ainda o que é lenitivo. Muitos já esqueceram seu significado tamanha a dureza destes tempos). Consolo nesta cidade triste e desmantelada.
 
photo: jfinatto, 1º jan.2017
 
O porto-alegrense virou uma pessoa mal-educada, grosseira e agressiva. É o que se vê no trânsito, nas lojas, dentro dos ônibus, em toda parte. Se você não faz parte deste grupo, perdoe. Mas a média da população está assim, infelizmente. Por isso eu, quando estou por aqui, busco as praças onde ainda é possível encontrar um pouco da humanidade perdida deste outrora acolhedor burgo.

photo: jfinatto, 1º jan.2017
 
Mas eu quero falar dos hibiscos. Durante caminhada para  equilibrar o esqueleto, no entardecer de 31 de dezembro, na Praça da Encol, percebi arbustos de hibiscos, alguns vermelhos, outros cor-de-rosa. Um brilho só. Voltei no dia primeiro para fotografá-los e guardá-los assim do esquecimento. Estão no auge do encanto. Façamos por merecer.

photo: jfinatto, 1º jan. 2017