quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

A força do amanhecer

Jorge Adelar Finatto

Desde o século passado, eu mesmo cuido dos meus sapatos.

Limpo, escovo, guardo. Ontem, num shopping de Porto Alegre, quebrei essa rotina. Dois jovens, um rapaz e uma moça, com cerca de vinte e cinco anos cada um, trabalhavam engraxando e dando brilho nos calçados. Sentei-me numa das cadeiras. Perguntei se havia outros trabalhando ali com eles. Me disseram que sim, duas mulheres e três homens revezavam-se durante os turnos. Indaguei ainda se estudavam. Resposta: sim, eram universitários.

A jovem que me atendeu era estudante de engenharia. O colega ao lado dela estudava computação. Eu fiquei impressionado com o exemplo deles. Estão ralando, trabalhando duro. Têm projetos de vida, lutam todos os dias para alcançar seus objetivos e, pelo que percebi, nada os deterá.

Eu também trabalhei em ofícios humildes, aprendi muito e me orgulho disso. Sei que todo trabalho humano é socialmente importante e digno do maior respeito. Tem quem prefira roubar os outros. Fazem qualquer negócio para alcançar dinheiro e poder. 

Aqueles jovens do shopping reforçam minha crença de que existe um outro Brasil, o das pessoas honestas, que acreditam no bem e numa vida melhor através do estudo e do trabalho. Gente que não aparece todo dia no noticiário, mas que está aí, viva, firme, fazendo o moinho do país girar.

Não duvido do poder da maldade. Mas acredito, acima de tudo, na força invencível da dignidade, da esperança ativa que constrói o amanhecer.


4 comentários:

  1. Adelar, às vezes, temos estas agradáveis surpresas. É incomum, mas elas existem.
    Em Curitiba encontrei um atendente de Hotel que estudava Relações Internacionais, numa universidade local.
    Também conheço taxistas-escritores, como o Mauro Castro, do do blog Taxitramas, que tem um texto humorístico muito bom.
    Isto nos faz acreditar que algumas sementes estão vingando, neste solo estéril do século XX.
    Tua crônica transmite esperança e, esta, é uma flor drummondiana que nasceu no asfalto...

    Abraço.

    Ricardo Mainieri

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  2. Não há como não se emocionar com a leitura do texto, de extrema qualidade. Percebe-se nele a palavra trabalhada, lapidada, entregue ao leitor em estado precioso. Pela beleza e profundidade literárias, o blog já se encontra entre os melhores do gênero no País. Parabéns e vida longa ao seu autor!
    Abs, Lorenzo

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  3. Lorenzo, só quem tem grandeza de alma é capaz de notar a presença do outro, reconhecer-lhe alguma virtude. Fico muito feliz e colho com humildade a tua manifestação.
    Um abraço.
    JAF

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  4. Ricardo, as pessoas a quem nos referimos são importantes pelo exemplo de vida. O país precisa reparar mais nelas. Nesse território de trevas que é o planeta, elas são pontos de luz.
    Abraço.
    JAF

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