Jorge Adelar Finatto
Não esqueçam
de me visitar
nas noites
de inverno
quando o medo
cobra caro
e as feridas
não deixam mentir
insolúvel jogo
de espelhos
entre mim
e o que fui
ando bêbado
pela casa
meu coração
é operário
desempregado
com filho pra criar
mulher feia
sem crédito no armazém
me enrosco
em invenções
inúteis
pra repartir contigo
um espaço de ternura
sinto umas
coisas estranhas
caminharem atrás de mim
um cano de fuzil
um casal de velhos famintos
um câncer
e me desagrada não ser
como certos fantasmas
convoco o
silêncio e
suas raízes
inauguro a
manhã
não, eu não sou
uma estrela
um rio
um barco
nada se compara
ao que sinto
preciso todos
ao redor da mesa
principalmente
os desaparecidos
como certos crepúsculos
que a gente vê
fogem e nunca mais
_______
Poema do livro Claridade, co-edição Prefeitura Municipal de Porto Alegre, Editora Movimento, Porto Alegre, 1983.
Foto: J. Finatto
Este poema é um daqueles "matadores".
ResponderExcluirNele estão sintetizadas as angústias de uma geração que pensou, sentiu, se solidarizou, mas que viveu à margem do processo decisório e que teve de calar muitas vezes...
Muito me identifico com isso, com os anos setenta/oitenta, quando ousar pensar diferente era perigoso...
Vopu tomar emprestada esta pequena obra-prima e reproduzí-la em meu blog.
Encare como um singelo presente de Natal!
Abraço.
Ricardo Mainieri
Muito, muito obrigado, Ricardo, e um grande abraço, amigo.
ResponderExcluirJF
deus meu, adelar, "meu coraçao é mulher feia sem crédito no armazem"...Morri, ali! Poemaço, poeta!
ResponderExcluirAgradeço, com muito atraso mas de coração.
ExcluirEste poema é impressionante. Parabéns!
ResponderExcluirAbraço, Adelar!
Grande abraço, caro Anônimo.
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