Jorge Adelar Finatto
photo: Eugénio de Castro |
Fiz uma relação de livros de escritores portugueses antes de sair do Brasil. São obras que não encontro na Terra de Vera Cruz. Achei quase todos, com duas exceções. Lisboa, livro de bordo (crônicas, 1997), de José Cardoso Pires (1925-1998), e Constança (poesia, 1900), de Eugénio de Castro (1869-1944).
Percorri cerca de 20 livrarias e alfarrabistas, entre o Porto e Lisboa, e nada. Na terça passada encerrei a busca visitando velhos alfarrabistas do Bairro Alto. A resposta foi a mesma: não existem mais.
Esses livros não podem faltar na livrarias.
A Lisboa de Cardoso Pires é a cidade vista a partir da alma do grande escritor, capaz de traçar notáveis sínteses em poucas linhas com seu olhar penetrante e sensível.
photo: José Cardoso Pires |
A Lisboa de Cardoso Pires é a cidade vista a partir da alma do grande escritor, capaz de traçar notáveis sínteses em poucas linhas com seu olhar penetrante e sensível.
Constança foi uma indicação de Don Miguel de Unamuno quando li, ainda em Salamanca, o seu Por tierras de Portugal y de España.* Diz o genial e valoroso filósofo espanhol:
Portugal parece a pátria dos amores tristes e dos grandes naufrágios.
(...) nenhuma obra (de Eugénio de Castro), a meu entender, e sobretudo a meu sentir, sobrepuja Constança, publicada em 1900. Constança é sua obra mais profundamente portuguesa, aquela em que sua alma conseguiu vibrar mais em uníssono com a alma de seu povo. É como se sua mão ao escrevê-la se houvesse convertido na arpa eólica de seu povo, vibrando ao sopro da alma deste. A lírica de Constança é a mais alta e mais nobre lírica, aquela que, sendo profundamente coletiva, é, por isso mesmo, profundamente pessoal.
Constança foi a mulher do infante D. Pedro, aquele da infeliz Inês de Castro, cujos trágicos amores imortalizou Camões.
Vindas de Don Miguel, imaginem o significado destas palavras.
Aí estão as duas sentidas faltas na mala dos portugueses que levarei comigo.
Manuel António Pina. Wikipédia |
Nunca entendi por que estamos tão distantes da literatura e da cultura dos países de língua portuguesa. Vivemos no Brasil uma espécie de isolamento dentro da lusofonia.
Autores como José Saramago, Mia Couto e, depois, António Lobo Antunes começaram a desembarcar em terras brasileiras nos últimos anos. É muito pouco diante da pluralidade de autores lusófonos.
Em Portugal, percebo que há também um distanciamento do Brasil, pouco se conhece.
Estou levando a mala pesada de livros, mas o esforço compensa. Entre outros, levo comigo Lobo Antunes, Alexandre O'Neill, Eugénio de Andrade, Agostinho da Silva, Herberto Hélder, Maria Gabriela Llansol, J. Cardoso Pires, Fernando Pessoa, J. Saramago, Maria Velho da Costa, Ruy Belo, Vitorino Nemésio, Manuel António Pina, Eduardo Salavisa.
Na Suíça consegui encontrar as obras de Rilke que perseguia. Em Madri, completei a biblioteca básica de Ortega y Gasset, graças à generosidade da Fundação Ortega y Gasset que me repassou, sem cobrar por isso, volumes fundamentais do filósofo.
Dos espanhóis tratarei em texto próprio. Os discos também merecem um post à parte.
De que vale, afinal, uma viagem, se não for para procurar aquilo que nos faz falta em nossa paisagem espiritual?
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*Por tierras de Portugal y de España, Miguel de Unamuno, Biblioteca Unamuno, Alianza Editorial, Madrid, 2011. Tradução do trecho acima: J. Finatto.
*Por tierras de Portugal y de España, Miguel de Unamuno, Biblioteca Unamuno, Alianza Editorial, Madrid, 2011. Tradução do trecho acima: J. Finatto.
O de Cardoso Pires tenho. Revi-me em muitos nomes que aqui foram citados como, por exemplo, Ortega e Gasset e, particularmente, o meu amigo Eduardo Salavisa. Gostaria, seguramente, de ter o conteúdo dessa mala ;)
ResponderExcluirCara hfm. Essa mala é a alegria e a motivação da viagem. É o que fica a nosso lado quando o resto termina. São os bons frutos colhidos em todas as estações. Um grande abraço.
ResponderExcluirUma bela seleção, Adelar. Tens, por acaso, nesta mágica mala, algum livro do Vítor Hugo Mãe, um português nascido na África, que vi em entrevista da TVE. Muito bom, o gajo. Abração. Ricardo Mainieri
ResponderExcluirCaro Ricardo. Não consegui trazer todos que queria, nem perto disso. Ainda assim, a mala ficou lotada (e não é pequena). De qualquer forma, fica pra próxima viagem. Se não me engano, o Valter Hugo Mãe já tem livro editado no Brasil. Um abraço. PS Tenho que te entregar o Herberto Helder, vamos combinar, quando for a Porto Alegre (estou chegando agora de volta)
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