Jorge Adelar Finatto
Um dia desses não se encontra todo dia no calendário. Céu azul, sol amarelo, frio, um cálido frio de blusa e casacão. A praça tem muita gente e pouco cachorro (criaram um cachorródromo ali, até que enfim).
É um dia pra se guardar num cartão-postal no álbum da memória. Pra recordar num daqueles momentos em que tudo em volta parece triste e sem sentido.
Vou caminhando pela tarde azul.
Vou caminhando pela tarde azul.
À beira do Guaíba, a cidade se deixa embalar - às vezes até sonhar - nas ondas. Vista assim desde a margem, é uma fotografia que emerge de um tempo antigo com personagens de chapéu, bengala, vestido comprido, sombrinha. E faetontes flutuam nas ruas.
Agora é outra coisa. Cimento e vidro, avião furando nuvem, janelas abandonadas, lixo (muito lixo). Solidão.
Agora é outra coisa. Cimento e vidro, avião furando nuvem, janelas abandonadas, lixo (muito lixo). Solidão.
instalação de Nuno Ramos. photo: j.finatto |
Vamos em frente.
A cidade e seus sobreviventes. A cidade e seus barcos. A cidade e seus sonhadores no fim da tarde. A cidade e seus ciclistas que resistem. A cidade e seu cais. A cidade e seus ais.
A cidade e seus sobreviventes. A cidade e seus barcos. A cidade e seus sonhadores no fim da tarde. A cidade e seus ciclistas que resistem. A cidade e seu cais. A cidade e seus ais.
Depois uma esticada até a Fundação Iberê Camargo, o bonito edifício branco brilha na tarde de sol, à
beira
do
rio.
beira
do
rio.
Mas o famoso arquiteto Álvaro Siza, que projetou o moderno prédio, esqueceu que janelas foram feitas pra sonhar e admirar e, reduzindo-as a pouco e poucas, sonegou do olhar, na falta de outras finestras, a amplidão das águas, a face clara da cidade, as gaivotas, o pôr-do-sol.
Só
restam
nesgas.
O que é puro desperdício de beleza (na modestíssima opiniãozinha deste anônimo transeunte).
instalação de Nuno Ramos. photo: j.finatto |
Mas o famoso arquiteto Álvaro Siza, que projetou o moderno prédio, esqueceu que janelas foram feitas pra sonhar e admirar e, reduzindo-as a pouco e poucas, sonegou do olhar, na falta de outras finestras, a amplidão das águas, a face clara da cidade, as gaivotas, o pôr-do-sol.
Só
restam
nesgas.
O que é puro desperdício de beleza (na modestíssima opiniãozinha deste anônimo transeunte).
A instalação do artista Nuno Ramos¹, no último pavimento, Ensaio sobre a dádiva, é a possibilidade de poesia e construção de sentidos no imaginário do observador.
A arte é dádiva. A cidade é dádiva. A janela é dádiva. O olhar é dádiva. A mão estendida,
o silêncio
são
dádivas.
A troca humana imanente, urgente. A oferta e a recepção do que não tem preço em dinheiro.
"Um cavalo por um pierrô. Um violoncelo por um copo dágua."²
o silêncio
são
dádivas.
A troca humana imanente, urgente. A oferta e a recepção do que não tem preço em dinheiro.
"Um cavalo por um pierrô. Um violoncelo por um copo dágua."²
vídeo da instalação de Nuno Ramos. photo: j.finatto |
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¹.² Ensaio sobre a dádiva. Instalação de Nuno Ramos na Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre. Para maiores detalhes, acesse:
Foto de abertura do blog: vista da Fundação Iberê Camargo. As fotos de abertura mudam a cada dois dias, em média.
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