segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Lágrimas no mármore

Jorge Adelar Finatto
 
photo: Flávia Boni. divulgação da Prefeitura
Municipal de Porto Alegre*
 
Guaíba e seus afluentes, conjunto de quatro esculturas concluído em 1866 pelo arquiteto italiano Giuseppe Obino, foi retirado da Praça Dom Sebastião, em Porto Alegre, e transferido para os jardins da Hidráulica Moinhos de Vento. As estátuas encontravam-se naquele local desde 1936. O motivo da mudança é preservar as esculturas da ação de vândalos.
 
A obra é considerada o monumento mais antigo de Porto Alegre e foi concebida em mármore de Carrara com cinco esculturas, instaladas inicialmente na Praça da Matriz, junto a uma fonte. Anos depois foram dali arrancadas para dar lugar ao monumento a Júlio de Castilhos. 

A escultura que representava o rio Guaíba desapareceu quando o conjunto foi vendido a uma marmoraria para virar pó, em 1924, o que só não aconteceu devido a um protesto da população. A prefeitura readquiriu as peças, reinstalando-as então na Praça Dom Sebastião ao lado do Colégio Rosário.
 
Das quatro estátuas, duas são figuras femininas, as ninfas, e representam os rios Caí e Sinos. As outras são masculinas, os netunos, e simbolizam os rios Jacuí e Gravataí.
 
A medida adotada pela Prefeitura de Porto Alegre pretende salvar as obras da destruição. Algumas já apresentam partes quebradas (braços e narizes), além de sinais de pedradas. Agora passarão por um processo de limpeza e recuperação no novo ambiente, que é cercado e tem vigilância.
 
Não imagino o que se passa na cabeça de quem destrói o patrimônio que é de todos e carrega a memória da cidade. Memória afetiva para muitos, como no meu caso. Freqüentei a Praça Dom Sebastião e seus monumentos quando estudei no Rosário, entre os anos 1969 e 1975. Estavam ali embelezando o lugar, faziam parte da minha e nossa vida de adolescentes.

Não duvido que as estátuas tenham derramado lágrimas, na quarta-feira, 8 de outubro, quando foram retiradas do ambiente onde viveram nas últimas décadas. Muitas gerações passaram pela praça sob o olhar das ninfas e netunos. Acaso não haverá, nesses seres de mármore, uma espécie de sentimento, imperceptível aos humanos, esse mesmo que falta aos destruidores do patrimônio público?
 
Os indivíduos que invadem espaços comuns para acabar com as poucas e raras obras de arte que temos em nossas ruas, praças e parques prestam um grande serviço à desumanização da cidade. Embora não tenham poder de destruir as lembranças de quem freqüentou esses lugares, transformam em pó as memórias do futuro.
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 Notícia e fotos no site da Prefeitura de Porto Alegre:
http://www2.portoalegre.rs.gov.br/portal_pmpa_novo/default.php?p_noticia=173063&HIDRAULICA 

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