terça-feira, 3 de maio de 2016

O escrevinhador e o pássaro

Jorge Finatto
 
photo: jfinatto

Há sempre uma palavra querendo sair, porque existe sempre algo a partilhar. Por isso se escreve e se fala. Por isso escutamos e lemos a voz do outro. Somos palavra. 
 
Escrever fora da proposta comercial não tem retorno. Nem me refiro a algo material. Falo de simples troca, cumplicidade literária, espiritual. Mas a gente faz mesmo assim, por gosto mesmo. Dizem que é coisa de desocupado, mas às vezes é muito mais.
 
Certos vagabundos têm mil coisas pra dizer, como o Carlitos, do Charlie Chaplin. Mostrou-nos maravilhas sobre as coisas do coração, ao tempo do cinema mudo, sem efeitos especiais. Vale a pena ouvir este sublime vagabundo.

A escrita dá muito trabalho, ainda que não pareça. É ofício que se aprende uma vida inteira. Escrevo por prazer e por angústia. Deve ser pela mesma razão que o pássaro canta sozinho no seu galho, sem nenhuma ideia de recompensa ou plateia.

Canta simplesmente. Canta para si e para quem quiser ouvir, porque cantar é o que gosta de fazer. É o seu momento no mundo. Triste é passar pela vida sem ser ouvido.

Há felicidade na escrita como na leitura. A alegria do fazer em si mesmo, do trabalho em construção. Viajar num trem de palavras por caminhos de vales e montanhas. É bom saber que essa viagem pode ter significado para alguém.

Um dia a luz da palavra vai se apagar como acontece com tudo que respira e ilumina. Dura o tempo do vaga-lume. Porque tudo tem seu tempo. Continuamos no galho virtual a lançar signos às estrelas. Uma lanterna de mina na escuridão.
 

4 comentários:

  1. Que texto tão verdadeiramente belo. Helena Monteiro

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  2. Helena. Acabei de chegar da rua, onde saí pela primeira vez sozinho depois que meu olho direito apagou. Encontrei teu comentário. Uma iluminação. Que a luz continue entrando pelas frestas da alma, nos fazendo ver a beleza que são as pessoas e esse mundo, apesar de tudo. Um grande abraço.

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  3. É verdade escrever dá trabalho. Dá trabalho "parir", as vezes,até lágrimas. E como é "mais grande" o escrever do que o falar. A palavra escrita pode identificar escritor e leitor, mesmo à oceanos de espaço e tempo.

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  4. A palavra nos une, nos torna humanos. Faz a ponte. A palavra certa pode salvar um momento, um dia, uma vida. A palavra errada pode destruir. Tem de haver coração por trás. E responsa. Abraço, Marina.

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