segunda-feira, 30 de julho de 2018

A velha casa da esquina

Jorge Finatto
 
photo: jfinatto
 

HOJE PASSEI em frente à velha casa da esquina. Fazia tempo que não a via. Fica perto do edifício onde moro, a uns cem metros da Praça Gustavo Langsch, no Bairro Bela Vista. Faz mais de vinte anos que gosto de olhar pra ela. O que acontece quando estou na cidade e caminho pelas ruas do bairro.
 
Não sei quem mora naquela casa. Mas é uma casa como as casas de antigamente, do tempo em que havia casas nas ruas, e não bunkers. Tem uma cerca baixa, um jardim, umas árvores (poucas e não muito altas), um telhado com duas águas.
 
Imagino que deve ter um sótão. Mas não tem mansarda. Talvez uma claraboia. Não sei se tem porão. E, se tiver, não sei se cheira a barril de vinho como os porões das casas da serra, onde nasci e vivi parte da infância.
 
Não sei se a velha casa da esquina tem fantasmas. Acho que deve ter, porque toda casa que se preze tem fantasmas.
 
Na minha antiga casa, eles saíam dos retratos à noite, quando todos dormiam, e conversavam longas conversas enrolados em seus capotes e mantas. Deles apenas se viam leves sombras pelos cantos (quase ninguém percebia). Às vezes iam para o telhado e lá fumavam e discutiam assuntos de fantasma. Antes do dia nascer, voltavam para os retratos.
 
A velha casa da esquina tem um cão, um boxer, alegrão e atento como todo boxer (mas nenhum malandro lhe passa despercebido) Ama as crianças, e as pessoas de bem não tem com que se preocupar com ele. Os outros...
 
A velha casa da esquina, no seu jeito claro, me traz recordações. Acho que ali ninguém morreu e todos vivem a algaravia dos lares felizes (as pessoas se alegram, às vezes até brigam, se desentendem, mas ninguém fica de mal e todos são imprescindíveis em volta da mesa).
 
Embora seus habitantes nem sonhem com isso, me sinto em casa quando passo pela velha casa da esquina.
 

2 comentários:

  1. Recordar é viver, já dizia a velha música. É bom ter os olhos atentos para as coisas simples que teimam em existir. Persevere em tuas caminhadas.

    Abraço.

    Ricardo Mainieri

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    1. É preciso olhar para as coisas que nos prendem o coração, estar com elas, nesses tempos tão difíceis. Um grande abraço, Ricardo!

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