segunda-feira, 19 de novembro de 2018

Fora do poema tudo é caos

Jorge Finatto 
 
photo: j.finatto
 
 
Esta frase - FORA DO POEMA TUDO É CAOS - me saiu numa entrevista* ao jornal Zero Hora, de 1984, tendo como entrevistador o jornalista Danilo Ucha. Naquela época  ainda se entrevistavam poetas da aldeia na imprensa local.

Os meios de comunicação se expandiram, mas os espaços para divulgação de arte e literatura, fora do interesse estritamente comercial, diminuíram tanto que tenho dúvida se existem hoje entre nós.

A entrevista versava sobre o lançamento do meu livro Claridade, de poemas, selecionado para publicação dentro do Plano Editorial de 1983, da Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Porto Alegre.

Consta, na abertura da matéria, que o autor era um jovem jornalista e poeta de 27 anos. Custo acreditar que já tive essa idade.

O tempo passa, a gente fica mais perdido, mas certas verdades permanecem. Está escrito que o poeta (aquele jovem poeta de 27) estava angustiado e perplexo "diante de uma realidade maluca, atrasada e violenta como a brasileira".

Também está dito que os poemas falavam de uma pessoa que "experimentou na consciência e na pele a dolorosa sensação de viver uma realidade sem perspectivas. Onde o indivíduo se sente arrastado pela opressão e sonhar é quase proibido. Onde viver se tornou a maior transgressão".

Nos poemas, apesar disso, "constata-se a convivência mais harmoniosa entre linguagem e vida. O mundo silencioso onde o real e o imaginário caminham juntos. Há uma integração profunda com a aventura humana. A palavra não salvará o homem, mas será sua projeção e seu espelho. Uma espécie de testemunha de seu próprio destino".

O poeta "trabalha com o poema numa região de luz, sem concessões ao desespero e à morte, acredita na força das coisas belas, na energia positiva das pessoas capaz de gerar zonas de intensa verdade e esperança.

"A fé na existência e no amor sobressai-se como o caminho destinado a vencer o escuro e a dor. O poder transcendente da vida sobre a morte, através da dimensão do amor, transforma e eleva".

Conclui o bardo de 27: "Nunca fiz literatura pelo simples prazer de escrever, ela surgiu na minha vida como uma necessidade inarredável, quase tão vital como respirar. Eu até preferiria viver sem escrever. O grande Manuel Bandeira disse certa vez que só se sentia seguro no chão da poesia. Eu sinto isso. Fora do poema o mundo é algo incompreensível e muitas vezes insuportável. É preciso criar tudo de novo, começar a vida das cinzas, renascer. Fora do poema tudo é caos".

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*Entrevista publicada no jornal Zero Hora, de Porto Alegre, em 13.4.1984. A matéria foi feita pelo jornalista Danilo Ucha.
Texto publicado no blog em 18 de novembro de 2010. 
 

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