terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Os sintomas da alegria

 Jorge Finatto

photo: jfinatto



Acordou com uma insuportável vontade de viver. Foi no tempo da peste covid-19. Abriu a janela do quarto e recebeu no corpo o ar fresco do amanhecer. Respirou fundo. Olhou o Contraforte dos Capuchinhos ao longe. Suspirou, fechou os olhos. 

Descobriu que as velhas mágoas e dores já não doíam como antes. Passaram porque tudo tem que passar. Porque o perdão é talvez  o melhor dos remédios. 

A peste também haveria de passar.

Sentiu uma terrível vontade de agradecer. Estava vivo, respirava e olhava as montanhas junto à janela. A morte, esse injusto evento, nunca teria a palavra final. Era apenas uma mudança de capítulo. Uma passagem para algo desconhecido e, provavelmente, melhor. 

A vida é um milagre que germina do encontro de dois ermos. O tempo não é inimigo, antes um aliado. Uma estrada. Uma estrela em movimento na escuridão. Há beleza até nas marcas que o tempo esculpe na face. 

Existe um universo inteiro de perguntas. Mas as respostas essenciais não estão disponíveis.

Somos parte do mistério. 

Somos o mistério.

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