terça-feira, 3 de dezembro de 2019
quarta-feira, 27 de novembro de 2019
Viagem num barco de papel
Jorge Finatto
![]() |
Cartaz de divulgação: Emily M. Borges, Ajuris. |
Amanhã, 28 de novembro, a partir das 19h, na Escola Superior da Magistratura, em Porto Alegre, vou receber os leitores e amigos para o lançamento do livro de crônicas Navegador de barco de papel.
Convido todos a embarcar nesta viagem. Vamos dar uma volta pelo Guaíba e pela Via Láctea a bordo do barquinho.
Afinal, imaginar não custa nada, e sonhar é um dever.
terça-feira, 26 de novembro de 2019
Não escrevemos o primeiro verso
Jorge Finatto
![]() |
photo: j.finatto |
Não escrevemos o primeiro verso
há tudo por ser dito
mas sou teimoso
insisto no jogo
quando desanimares pensa em mim
que não abandonei as ferramentas
que não dei um verso para a eternidade
_____________
Do livro Claridade, edição Prefeitura Municipal de Porto Alegre e Editora Movimento, 1983.
domingo, 17 de novembro de 2019
Pequenos mistérios
Jorge Finatto
Entre pétalas, texto de Rainer Maria Rilke* photo: jfinatto |
COSTUMO PÔR PÉTALAS e folhas entre páginas de livros, cadernos de anotações. Acho bonito abrir tempos depois e encontrar as pétalas e as folhas secas com suas cores e nervuras à flor da pele. Elas parecem carregar a memória de um tempo, de um jardim, de uma sensibilidade.
Em álbuns de fotografia também fica delicado. Era comum naqueles álbuns de recordações das moças de antigamente. Pego as pétalas e folhas caídas no outono.
Os livros, fisicamente, pertencem ao mundo vegetal. Com o conteúdo das palavras transformam-se em objetos espirituais. Nem todos, claro. Há alguns que nunca alcançam este patamar.
O mundo está cheio de coisas esquecidas. Será que ainda se usam folhas e pétalas entre páginas? Será que alguém tem álbum de fotografias? Será que livros ainda têm lugar nas casas? Será que existem moças sonhadoras e cadernos de recordações?
_________
Texto revisto, publicado em 18 de outubro de 2017.
*Cartas do poeta sobre a vida. Rainer Maria Rilke. Organização de Ulrich Baer. Tradução de Milton Camargo Mota. Livraria Martins Fontes Editora Ltda. São Paulo, 2007.
O epitáfio de Rilke:
https://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/search?q=O+epit%C3%A1fio+de+Rilke
*Cartas do poeta sobre a vida. Rainer Maria Rilke. Organização de Ulrich Baer. Tradução de Milton Camargo Mota. Livraria Martins Fontes Editora Ltda. São Paulo, 2007.
O epitáfio de Rilke:
https://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/search?q=O+epit%C3%A1fio+de+Rilke
quinta-feira, 14 de novembro de 2019
O hotelzinho de Rilke e Goethe
Jorge Finatto
Olhai, as árvores são; as casas que habitamos, resistem. Somente nós passamos (...)
fragmento da Segunda Elegia de Duíno. Rainer Maria Rilke ¹
NA CIDADEZINHA DE SIERRE, sul da Suíça, no Cantão do Valais, hospedei-me num pequeno hotel 3 estrelas. Perto da estação de trem, tem comida caseira regional e bom vinho. O imóvel é do século XVIII e, segundo seus registros, recebeu no passado, como hóspedes, Goethe (1749 - 1832) e Rilke (1875 - 1926), dois grandes da literatura de língua alemã.
O Hôtel de la Poste passou por reformas ao longo do tempo, claro. É simples, caprichoso e as pessoas são acolhedoras. Ocupei um quarto no segundo andar, imaginando se Rilke ou Goethe teriam ficado nele alguma vez. Será que escreveram na mesinha junto da janela, atrás da cortina cor-de-rosa?
Enquanto me acomodava, a neve tecia caminhos de úmido algodão lá fora.
Enquanto me acomodava, a neve tecia caminhos de úmido algodão lá fora.
Hôtel de la Poste.Sierre. photo: jfinatto |
vista do quarto. Sierre. photo: jfinatto |
A razão de minha visita à pícola cidade, cercada pelo maciço rochoso coberto de neve dos Alpes, era percorrer os passos de Rilke em seus últimos cinco anos de vida. Na região de Sierre terminou de escrever as Elegias de Duíno, iniciadas na Itália em 1912. E verteu para o francês parte de seus poemas, além de outras criações e de cultivar a extensa correspondência.
Entre 1921 e 1926, viveu no castelo de Muzot, emprestado por alguém da aristocracia local. O imóvel situa-se mais exatamente na pequena e calma localidade de Veyras, ao lado de Sierre. Nele escreveu e recebeu muitas cartas, fez poemas, traduziu, conviveu, amou, planejou viagens, foi feliz e chorou em silêncio sentado no banco sob a parreira do quintal.
Muzot pouco lembra um castelo, não é grande nem suntuoso. Trata-se na verdade de uma construção que lembra uma torre. Não se pode entrar no local, pois é propriedade particular. Não sei se possui objetos do poeta, não há informações a respeito. Mas o fantasma de Rilke deve perambular por seus espelhos.
Em Muzot compôs o poema-epitáfio. E mandou construir seu túmulo ao lado da igrejinha que costumava freqüentar, em Rarogne, a cerca de 30 quilômetros de Sierre, engastada na encosta alpina, depois que se descobriu com leucemia, na época incurável.
Aquele lugar tinha para Rilke um sentido místico. Situado sobre uma colina, com ampla visão dos alpes a leste e oeste, a passagem do rio Ródano no meio dos vales, nos remete ao sagrado. Há algo nesta paisagem que não se explica. Uma visão mágica que inspira um forte sentimento de transcendência.
Aquele lugar tinha para Rilke um sentido místico. Situado sobre uma colina, com ampla visão dos alpes a leste e oeste, a passagem do rio Ródano no meio dos vales, nos remete ao sagrado. Há algo nesta paisagem que não se explica. Uma visão mágica que inspira um forte sentimento de transcendência.
Igreja de Rarogne, ao lado da qual está enterrado Rilke. photo: jfinatto |
túmulo de Rilke. Rarogne. photo: jfinatto |
A cidade de Sierre, na qual cultivou relações, mostra interesse pela memória do poeta, a começar pela Fundação Rilke² ali existente. Numa livraria, porém, os livreiros mal conheciam seu nome, o que me causou certo espanto. Talvez por ser um devoto da poesia rilkeana esperava mais. Encontrei poucos livros dele na estante, comprei seus poemas franceses.
Já escrevi no blog sobre como descobri seu túmulo solitário e coberto de neve e da emoção que senti ao ler o famoso epitáfio inscrito na rósea e gelada pedra tumular.³
epitáfio do poeta. photo: jfinatto
Rosa, ó pura contradição,
volúpia,
de ser o sono de ninguém
sob tantas
pálpebras. 4
|
Caminhei ao léu nas ruas solitárias e geladas de Sierre. Admirei da estrada o castelo de Muzot com seu quintal, a parreira e o banco.
Memórias de um poeta que me acompanha desde a adolescência, a quem sempre serei grato pelas lições de vida e poesia em seus livros. Cartas a um jovem poeta é um dos grande livros já produzidos pelo homem em todos os tempos. O poeta genial, humilde e cordial que nunca se cansou de tentar desvelar os mistérios de nossa passagem pelo mundo.
_____________
¹ Elegias de Duíno. Rainer Maria Rilke. Tradução e comentários de Dora Ferreira da Silva. Edição bilíngüe alemão-português. Editora Globo, São Paulo, 2001.
² Fundação Rilke:
http://fondationrilke.ch/la-fondation/
³ O epitáfio de Rilke:
http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/2014/12/o-epitafio-de-rilke.html
4 Tradução de Manuel Bandeira, em sua Antologia Poética, Livraria José Olympio Editora, 7ª edição, Rio de Janeiro, 1974.
_________
Texto revisto, publicado em 13 de novembro, 2016.
sábado, 9 de novembro de 2019
Segredos do implúvio
Jorge Finatto
photo: jfinatto. Serra Gaúcha |
I
Dizem
que escrever
poemas
é ofício
de pouco valimento
mas pouco se revelou
sobre a memória
da sombra
as paredes úmidas
da velha casa de madeira
o sombrio corredor
onde se morria um dia
todos os dias
sem notícia
sem amanhã
II
alguém precisava
recordar
os soturnos habitantes
da rua humilde
na cidade serrana
lembrar o cheiro
de suas vestes
as pedras soltas
na porta das casas
os casacos pretos
nas manhãs de geada
III
nada ou muito pouco
se disse
dos segredos do implúvio
eu me pergunto por que
esse vazio em torno
estaria no silêncio
acre das caves
o destino de partir?
trabalho lento
nas escarpas
do coração
IV
não fossem
os trilhos
do trem
o barulho santo
do trem
atravessando
a madrugada
criando ao menos
em tese
a possibilidade
da fuga
muitos teriam
desistido de tudo
ali mesmo
como fez Chico
o Esquecido
V
o coração não é
assim mero
cresce em segredo
na dura colheita
não se esvazia
o coração
como se esgotam
as cisternas
VI
alguém precisava contar
a náusea persistente
a longa e tortuosa estrada
que desce na Capital
melhor não inventar
histórias
de castelos e linhagens
que nunca existiram
e se houve
federam
como podem feder
as escadarias
dessas obscuras passagens
perdidas no planeta
que recolhem
seres rastejantes
VII
o que se registra
no tombo do tempo
é que há um menino
imóvel
à beira da jovem defunta
naquele lugar
a despedida
com alguma flor
sussurros abafados
ele pergunta
onde ela foi habitar
o que vê
é a morte
e seu absurdo trabalho
convertendo em pó
a luz dos olhos
________
Do livro O habitante da bruma, Editora Mercado Aberto, Porto Alegre, 1998.
Marcadores:
implúvio,
segredos,
serra gaúcha
segunda-feira, 4 de novembro de 2019
Maria Madalena
Jorge Finatto
photo: jfinatto |
Maria Madalena teve o privilégio de ser a primeira pessoa a ver Jesus após a Ressurreição. Nenhum dos apóstolos teve essa ventura. Havia nas cercanias do lugar onde ele foi assassinado (Monte Gólgota, Jerusalém) um jardim e, neste, um túmulo novo ainda não usado. Foi nele que o sepultaram José de Arimateia (discípulo secreto de Cristo, homem influente e rico) e Nicodemos, o corpo envolto em fino linho.
Enquanto ela chorava diante do túmulo, onde o corpo não estava mais, Jesus apareceu-lhe. Era de manhã muito cedo. Num primeiro momento ela não o reconheceu. Até que ele fala: "Maria!". E a alegria de Madalena é infinita. Em lágrimas, ela toca o Senhor levantado dos mortos. Ele então lhe diz:
- Para de agarrar-te a mim. Porque ainda não ascendi para junto do Pai. Mas, vai aos meus irmãos e dize-lhes: "Eu ascendo para junto de meu Pai e vosso Pai, e para meu Deus e vosso Deus". (João 20:17)
Impressiona o amor de Maria Madalena por Cristo e o sentimento que os unia. Ele tinha expulsado sete demônios dela e a partir de então ela passou a segui-lo e amá-lo, segundo o relato bíblico.
Em sua passagem pelo mundo, Jesus mostrou-se um ser espiritual num corpo humano. Um ser que valorizava muito o afeto. Daí ter proclamado a importância de amarmos ao próximo como a nós mesmos. Teve o amor como algo urgente e necessário.
Estamos à véspera da Ressurreição, no domingo de Páscoa. Relendo os quatro Evangelhos por esses dias (Mateus, Marcos, Lucas e João), dei-me conta de que, durante a vida, assim como nas horas finais e na Ressurreição, Cristo foi acompanhado de perto, modo amoroso e dedicado, por mulheres.
O aparecimento de Jesus a Maria Madalena é revelador disso. É prova de gratidão e carinho. Mostra que ele não era indiferente à presença feminina, mas tinha-a em elevada consideração.
Não há informes sobre Maria Madalena (da aldeia de Magdala, cuja existência foi comprovada por recentes escavações em Israel), além dos Evangelhos. Sabe-se, por exemplo, que assistiu Cristo e os apóstolos com seus bens como outras mulheres também o fizeram (Lucas 8: 1, 2, 3).
Quem foi essa mulher? O que fez e como viveu? Que momentos luminosos compartilhou com Jesus? Como se passaram seus dias depois da morte de seu amado Senhor? São mistérios a desafiar interpretações e especulações.
Quem foi essa mulher? O que fez e como viveu? Que momentos luminosos compartilhou com Jesus? Como se passaram seus dias depois da morte de seu amado Senhor? São mistérios a desafiar interpretações e especulações.
Uma coisa, contudo, parece certa: por ser quem era e pelo seu amor, ela conquistou o coração de Jesus.
________
Texto revisto, publicado em 15 de abril de 2017.
Texto revisto, publicado em 15 de abril de 2017.
Assinar:
Postagens (Atom)