quarta-feira, 3 de março de 2010

O barco mais triste do mundo

Jorge Adelar Finatto



 
A minha paixão por barcos e navegações sempre me leva a cidades de mar ou rio. Sou um bicho das águas.

O fato de ter nascido e de viver numa cidade serrana é apenas uma das contradições que me definem.

O sonho menino de tornar-me marinheiro jamais me abandonou. Por isso, talvez, essa busca recorrente pelas águas e por embarcações.

A nostalgia dos barcos não sai do meu coração.

Em Coimbra, existe um barco de passageiros com o nome de Basófias, fundeado no pequeno cais, perto do centro da antiquíssima cidade portuguesa.

Resolvi um dia ir ao encontro do Basófias e fazer um passeio pelo Mondego, o rio que me faz sentir saudades de todos os rios do mundo.
Ocorre que, nas três ocasiões em que fui ao cais, não consegui realizar a navegação.

Numa das vezes, o barco estava em manutenção; noutra, não havia passageiros além de mim; numa outra ainda, o tempo mau não permitiu levantar âncora.

Em suma, para meu desencanto, nunca consegui navegar no Basófias. A nave permaneceu, no meu imaginário, como um barco que jamais saiu do cais.
photo: j.finatto. Coimbra
A tripulação do Basófias é composta por marinheiros uniformizados a rigor, afáveis no trato. A pose e o orgulho náutico não deixam dúvida de que estamos diante de calejados navegadores.

Às vezes, fico pensando.

O Basófias, nas amarras que o impedem de lançar-se ao rio e realizar o destino para o qual nasceu, é o barco mais triste do mundo.

Mas não deixa de ter sua graça a imóvel embarcação.

De certa forma, o Basófias é a metáfora da existência de muitos.

Dele me enterneço, porque é o retrato de tantas vidas que ficam à margem, esperando no cais, esperando por uma viagem que nunca acontecerá.


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Fotos: J.Finatto. Imagens de Coimbra, Portugal.

3 comentários:

  1. Da próxima vez que eu for até Coimbra, vou tentar embarcar no "seu" Basófias. Não para que me inveje, mas para que não perca a vontade de se fazer ao rio. Qualquer que ele seja.
    Rita Pimenta

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  2. A metáfora do navegador, o homem que tem o leme e a direção de sua vida, longe da faina diária e imerso nas águas profundas...
    Lembrei de Antônio Cícero, irmão de Marina Lima, grande letrista e poeta e sua canção Maresia:

    "Ah, se eu fosse marinheiro
    Seria doce o meu lar
    Não só o Rio de Janeiro
    A imensidão e o mar
    Leste Oeste Norte e Sul
    Onde um homem se situa
    Quando o sol sobre o azul
    Ou quando no mar a lua
    Não buscaria conforto
    Nem pensaria em dinheiro
    Um amor em cada porto
    Ah, se eu fosse marinheiro"

    Abraço.

    Ricardo Mainieri

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  3. A vida da gente e o navegar são sem dúvidas metáforas que se complementam. Como nos diz Paulinho da Viola: "Faça como o velho marinheiro/ Que durante o nevoeiro / Leva o barco devagar". Navegar é preciso! Abs, Lorenzo

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