sexta-feira, 19 de março de 2010

Três poemas

Jorge Adelar Finatto

VERDE

Das minhas cinzas faço um verde
nesse verde nasce um menino
eu sou o menino que acompanha este menino

somos filhos da fome do dia
como os potros que morreram cedo
nossos irmãos

na nossa rua nenhum deus mora
eis porque choramos quando o dia acaba
ou brilhamos como duas adagas ao sol

nossa canção
a invasão dos dias
nossa matéria
o que está na sombra e não tem nome




EVOCAÇÃO DE RILKE

Quem tomará a minha mão
na noite de vermes
quando o asco me derruba
feito cão pela esquina

quem de coração amigo
chegará para beber a gota
de ternura estrangulada

quem me chamará de irmão
na dor imensa
quando o medo me acerta
com suas espadas de fogo




TODO VIVENTE CARREGA

Todo vivente carrega
seu fardo de solidão
nas entranhas
cheiros rudes no corpo
primaveras esquecidas
na caduquice da memória

se eu prossigo
no caminho
não se iludam
é pura teimosia

__________
Poemas do livro Claridade, de Jorge Finatto. Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 1983.
Ilustrações: Maria Izabel Carbunck Schissi

2 comentários:

  1. Este teu livro é bom demais. Iguala-se quase ao Fazedor de Auroras, meu favorito.
    Tenho ele, comigo, habitando a estante.
    Nele, poemas carregam um pouco de nosso estado de espírito, naqueles nebulosos anos 80.
    A revolta contra a escuridão dos tempos, a esperança junto com os oprimidos, o imenso lirismo que teimava em impregnar nossa esperança.
    Apesar dos pesares, um tempo em que tinhamos, ainda, a companhia da Utopia...

    Abraço.

    Ricardo Mainieri

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  2. Muitíssimo obrigado, poeta Ricardo.
    A tua palavra é clara e sempre bem-vinda.

    JF

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