Sou habitante
da beira do rio
condenado
a não ver o rio
afundado em seco
decifro papéis
que nada me dizem
a página em branco
espera o verso
que não escreverei
o que encontro
no gabinete
a essa hora
da manhã
é não ter tempo
pra mais nada
enfrento a trama
invencível
a dor sem abrigo
a grande trituração
das almas
no processo
resta apenas
o duro ofício
que não pode
ser adiado
impossível fugir
o carteiro
envelhece
enquanto aguarda
as cartas
que não enviarei
observo por um momento
o voo branco
da gaivota
sobre o Guaíba
nesse instante
invade-me a tristeza
do prisioneiro
(a essa hora da manhã)
desapareço
na névoa
_______
Poema do livro Memorial da vida breve, Editora Nova Prova, Porto Alegre, 2007.
Foto: J.Finatto
Lindo isso:
ResponderExcluir"a grande trituração
das almas
no processo"
e sabemos o quanto é verdadeiro...
Beijos e ótima sexta-feira para ´nós!
Carol
O dilema do homem que se vê aprisionado pela sua "persona" social.
ResponderExcluirQuer a liberdade do voo, mas encontra o entre-choque de interesses nos processos que carregam ódios & disputas.
Sinto um pouco disso, Adelar, e sei que, embora , ás vezes, seja pesado de carregar, fornece combustível para a criação.
De belos poemas, como esse.
Abraço.
Ricardo Mainieri