Jorge Finatto
O BRASIL não consegue enfrentar temas cruciais que estão a gritar por solução todos os dias. Faz pelo menos 30 anos que não há uma política eficaz voltada ao saneamento das penitenciárias e à ressocialização dos apenados. O resultado é o que se vê nos bárbaros massacres ocorridos nos últimos dias em presídios do Amazonas, Roraima e Rio Grande do Norte, com requintes de decapitações e extrações de órgãos dos corpos, na terrível guerra das facções.
Estes são apenas os casos mais recentes que causaram forte impacto pelo insuportável grau de crueldade que os alimenta. Mas a violência física e psicológica é fato corriqueiro nas cadeias (destinadas a presos provisórios) e penitenciárias (para presos que cumprem pena em regime fechado). Fatos terríveis como os ocorridos são tragédias mil vezes anunciadas.
As autoridades federais e estaduais encarregadas da gestão material e da segurança dos estabelecimentos penais (leia-se Poder Executivo) têm um desempenho muito abaixo do esperado diante da crise prisional (antiga de décadas), mostrando-se às vezes confusas, resolvendo no improviso questões estruturais que demandam ação sistêmica. Não é de hoje que o Estado perdeu o controle das prisões.
O fato é que Estado e sociedade demonstram indiferença à dura realidade dos presídios. Não raro ouvem-se declarações estapafúrdias no sentido de que a violência entre presos é assunto de menor importância e que quanto mais se maltratarem e matarem uns aos outros melhor será. A tanto chegamos.
Acontece que os indivíduos que cometem barbáries nas casas prisionais retornam, mais cedo ou mais tarde, ao convívio social e, sem receber tratamento adequado durante a reclusão, aqui fora farão novas vítimas. Quantas pessoas mais vão morrer nessa espiral de horror?
A Constituição Federal não vigora no interior de boa parte de nossas prisões. Estabelece que é assegurado aos presos o respeito à sua integridade física e moral, mas não é o que se verifica. A Lei de Execução Penal é sábia e bastaria cumprir com seus princípios fundamentais para evitar o colapso em curso no país. Nela existe, por exemplo, importante previsão de participação da sociedade no processo de execução através dos conselhos da comunidade. No entanto, o sistema faliu por força da inércia do Estado, com cadeias superlotadas e tratamento desumano aos reclusos.
O enfrentamento da violência começa fora dos presídios com atenção às famílias, à infância e à juventude através de creches, atendimento à saúde, escolas, centros comunitários, formação profissional, oportunidades de trabalho, etc., aquelas coisas que todos precisam para uma vida razoavelmente digna. Para que isso aconteça é necessário combater com vigor e tenacidade a corrupção e a incompetência do andar de cima, que simplesmente desaparece com o dinheiro público. Não há falta de recursos no Brasil para estas e outras obras: há corrupção e má gestão.
Neste momento é essencial construir penitenciárias em condições de receber vida humana lá dentro, individualizando-se a execução com separação dos presos, como manda a LEP, para que se possa falar em ressocialização por meio do trabalho, do estudo e do provimento de necessidades básicas dos detentos.
É preciso dar fim às estações do inferno. Não existe esperança para um país que aceita a trágica e cotidiana violência no interior das prisões. Todas as violações que lá ocorrem acabam voltando para as ruas. O resultado é este círculo absurdo e intolerável de violência que tomou conta das nossas cidades e das nossas vidas.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul desenvolveu, no início dos anos 2000, o Projeto Trabalho para a Vida que pode servir de referência e inspiração na busca de soluções. Congregando dezenas de entidades civis e órgãos estatais, elaborou programas de ressocialização, colhendo bons resultados.
Iguais a esta existem outras iniciativas do Judiciário que podem contribuir para resolver em parte os desafios que se apresentam. Mas é necessário, antes de tudo, que a União e os Estados queiram realmente sair da improvisação e avançar nessa área que é talvez a mais esquecida e desprezada em nossa sociedade.
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Encarceramento degradante, danos morais:
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