quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Borges e Rilke

Jorge Finatto
 
cidadezinha de Sierre, Suíça. photo: jfinatto
 
Nossos nadas pouco diferem; é trivial e fortuita a circunstância de que sejas tu o leitor destes exercícios, e eu seu redator.* 
   Jorge Luis Borges
 
Faz algum tempo estive em Sierre, no Cantão do Valais, Suíça, para visitar o pequeno Castelo de Muzot onde viveu o poeta Rainer Maria Rilke entre 1921 e 1926. Nele o poeta concluiu as Elegias de Duíno, além de construir a parte final de sua obra.
 
Visitei também a fundação que leva seu nome na cidade. Depois fui a Rarogne à procura do túmulo do poeta. Uma visita afetiva como quem procura um velho parente a quem só se conhece em fotografia. Esse parentesco espiritual que se estabelece entre poetas e leitores. Já escrevi sobre detalhes curiosos desta visita aqui no blog.
 
Em ambos os lugares não havia viv'alma além de mim. Em Rarogne, além das ruas vazias e do silêncio,  nevava. Quase dava para ouvir os flocos escorregando no ar, caindo sobre a tarde. Na metade da montanha alpina, estava o túmulo, no chão, solitariamente posicionado ao lado de uma igreja, distante dos outros túmulos do cemitério interiorano.
 
Dali se avista o vale entre as enormes montanhas cobertas de neve em direção a um infinito horizonte cósmico. Não por acaso o próprio Rilke escolheu aquele lugar para última morada quando descobriu que estava com leucemia.
 
Em Genebra pensei visitar o Cimetière Plainpalais onde se encontra o túmulo de Borges.  Mas desisti. Creio que esgotei minha capacidade de ir a cemitérios-museus depois do Père-Lachaise, em Paris, do Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, e desse pequenino de Rarogne.
 
Talvez porque Borges esteja ainda muito vivo na sua Buenos Aires, e é fácil encontrá-lo nas calles e bibliotecas do mundo.
 
O fato é que ambos estão demasiado vivos nos livros que escreveram. Nenhum deles poderá queixar-se da posteridade que parece tratá-los muito bem, obrigado, dispensando-lhes carinho semelhante aos que possuem Dante, Shakespeare, Pessoa, Eliot, Bandeira, Frost, Bashô, Drummond e outros mortos imortais.
 
Quanto a mim, acho que já estou um pouco gasto pelo tempo para ficar visitando cemitérios, sendo recomendável deles manter esperta distância. Atento à máxima que nos diz: "quem não é visto não é lembrado".
 
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Primeira poesia. Jorge Luis Borges. pág. 15. Tradução de Josely Vianna Baptista. Companhia das Letras, São Paulo, 2007.
 

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