photo: jfinatto |
a vida de todos os dias, a que eu sempre quis {textos e imagens: Jorge Finatto}
Jorge Finatto
Uma tarde no cais Embarcadero. Olhando o movimenro das pessoas e dos barcos. Depois o pôr do sol avança como um incêndio sobre o Guaíba. Aos 67 eu sinto renovada ternura por tudo isso que foi e é também o meu lugar. Muitas pessoas que podiam estar aqui comigo não estão mais. Viajaram pra outras esferas. A gente viaja mesmo sem querer. Essa a lição do cais. Mas hoje estou aqui com os pés firmes no chão olhando a cidade na beira do rio. E não há solidão que atrapalhe tanta beleza.
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Jorge Finatto
"Este livro trata da solidão e do isolamento. O tema é abordado de forma delicada a partir de motivos simples do cotidiano, e o autor busca, através deles, a espiritualidade que emana dessa condição incontornável da vida humana. Se por um lado a solidão nos acompanha desde que nascemos, por outro necessitamos de proximidade para viver e realizar nossa humanidade. Quando reconhecemos nossa solidão, podemos caminhar de modo mais inteiro em direção ao outro."
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Photo de Bruna Gomes
Pedidos para:
acasadachuva@hotmail.com
No próximo dia 31 de outubro, a partir das 18h, estarei recebendo amigos e leitores no Z Café para a apresentação do meu livro Solitudes. O volume tem ilustrações de minha filha Clara Finatto. O endereço do Z é: av. Nilópolis, 543, em frente à Praça da Encol aqui em Porto Alegre. Venha para um copo e um abraço.
J.F.
[Amigos, devido a dificuldades inesperadas, não poderei, infelizmente, estar presente na Feira de Gramado. Desejo aos organizadores e autores sucesso no evento. Abraços.]
Poucas coisas me fazem descer os 1800 metros de altitude de Passo dos Ausentes. Não me agrada sair da querência.
Juan Niebla, regente cego da nossa orquestra de câmara, e Don Sigofredo de Alcantis, filósofo-mor da aldeia, estimularam-me a participar da Feira do Livro de Gramado.
Por essa razão, enfrentando geada, trovoadas e aguaceiro, estamos viajando por estradas de chão a bordo da inefável Pajero Full em direção à cidade do cinema.
Levamos camas de campanha, lampiões, lonas, uma cozinha compacta e saleta de madeira de armar para o mate, o chá e a charla.
Ficaremos acampados no Parque do Caracol, imediações do Arroio Tiririca, em Canela, onde receberemos companheiros de estrada, até o dia do autógrafo no belo casarão do Centro Municipal de Cultura.
Abraços.
Jorge Finatto
Em tempo de afetos ligeiros, não é comum ouvir alguém cantar de amores. Fala-se no fim do amor romântico. Não se anda mais com os pés em nuvens, não se voa entre estrelas com cata-vento ao chapéu.
Nada de emoções fortes que amolecem as pernas, apressam a respiração e ofusquem o pensamento. Dirá o poeta que roubaram da primavera as flores e, das naus, o vento cálido rumo à ilha desconhecida. O tempo não está para poemas desbragados cantando o amor.
Mas nem tudo são pedras. Ouça a canção “Chico” da cantora e compositora Luísa Sonza. Ela tem 25 anos e é natural da cidade de Tuparendi, no Rio Grande do Sul, nosso Estado tão devastado por ciclones nos últimos dias. A música do álbum “Escândalo Íntimo” é uma suave notícia em meio às inumeráveis tragédias que assolam a nós e ao planeta.
Ao embalo melódico da Bossa Nova, "Chico" é uma declaração de amor como não se usa mais. Arranca emoção mesmo dos corações mais desiludidos. Num mundo em que se perdeu a capacidade de amar o amor romântico, por medo de entregar o coração ou por qualquer outra coisa, ouvir “Chico” é um tapa na cara da indiferença.
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photo: jfinatto
Jorge Finatto
photo: Lago Lugano, Suíça, jfinatto |
Gosto de entrar na fotografia. E de viajar nela. Caminho na beira do lago. As gaivotas voam sobre as árvores e os bancos. Pouca gente no lugar. Início do outono.
Só penso em andar, mais nada. Em respirar, mais nada. Os dois pés no momento. O que não for agora não interessa nessa hora. Andar assim é sempre bom.
Depois sento no banco. Do outro lado é a Itália. Mais abaixo, a África. O mundo é mesmo um só quintal. Guardo o livro sobre o colo. Fecho os olhos, respiro fundo.
Habito o instante. Quero que todos fiquem bem.
JF
Uma casa
um jardim
um perfume
um sentimento
um tempo
tempo de
pensamento
e coração
o meu tempo
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texto e photo (sem filtro): jfinatto
Jorge Finatto
photo: jfinatto |
Jorge Finatto
photo: jfinatto |
O primeiro amigo que fiz quando cheguei em Porto Alegre aos seis anos foi o Guaíba. Não conhecia ninguém e acabara de me tornar órfão. Com a morte na alma, esperava o bonde passar e atravessava a rua Washington Luís.
Havia uma pracinha nas proximidades da Casa de Correção (velho presídio depois demolido). Na beira do rio, famílias estendiam toalhas e esteiras na areia e aproveitavam as tardes de verão. Era bonito ver.
Eu sentava por ali e ficava olhando o Guaíba com seus barcos, peixes, ilhas e aves. Uma grande descoberta para quem vinha da Serra.
De vez em quando um navio de grande porte entrava ou saía do porto deixando ao passar um sonoro e grave apito.
Nas nossas conversas o rio me acolheu e me deu consolo. Me ensinou que a vida segue sempre em frente como as águas e que tudo vale a pena.
Na fotografia, em primeiro plano, um galho com biguás reunidos. No fundo, à esquerda, a Ilha das Pedras Brancas, um lugar lindo que transformaram em prisão para presos políticos durante a ditadura militar (1964/1985). Depois, mais ao sul, a saída para a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico.
Jorge Finatto
A mais bela das estações, para o rude mortal que escreve estas linhas, é o outono. De boa vontade embrulharia o verão e o mandaria direto para o inverno.
Mas é no outono que eu renasço.
Outono significa transformação, as mudanças tão necessárias para a vida revigorar seu curso. É a concentração das seivas, reunião de forças, introspecção, preparo e passagem para um outro tempo.
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photo: jf
Jorge Finatto
photo: jfinatto |
Jorge Finatto
a Nena com amor
A nostálgica e suave melodia deste tango de 1930 (de Augustín Bardi e Enrique Cadícamo) me levou a encontrar a mulher que nunca teve namorado, que triste!
E a vi horas sem fim na janela do bairro pobre, olhando a rua vazia, onde algum moço passava de vez em quando, e ela então sonhava. Mas o moço apenas passava diante de sua janela, todos os moços passavam e se iam para outras ruas, outras moças.
Ela morava com a mãe, cuidava da casa e dos sobrinhos. Na calle com casas coloridas e flores humildes nas janelas, num bairro distante.
Uma ruazinha perdida no continente, um lugar escondido de Deus, um ermo esquecido ao sul do planeta. Igual a tantos no mundo. Lá ela morava.
Aos sábados, la que nunca tuvo novio se enfeitava com um vestido florido que ela mesma fizera e se ia pelas ruas do barrio com a sombrinha amarela doendo sob o sol.
Olhava as poucas vitrines, conversava na praça com as vizinhas, tomava refresco do vendedor ambulante. Comia algodão doce sentada no banco. Esperava...
Depois voltava sozinha pra casa por ruas estreitas. Assim passaram-se os anos. As amigas de infância se casaram, depois as filhas delas. A vida passou. Ninguém nunca entrou na sua vida. E as vizinhas diziam: la que nunca tuvo novio. Pobrecita!
Essas coisas eu vi e senti enquanto ouvia o tango no bandoneón de Rodolfo Mederos. Caminhei pela calle triste da pobre moça que nunca teve namorado. E chorei por ela.
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photo: Colonia del Sacramento, Uruguay, j.finatto.
Texto revisto, publicado antes em 25 maio 2015.
Jorge Finatto
Jorge Finatto
photo: jfinatto |
Jorge Finatto
foto: Alex Rocha, Prefeitura de Porto Alegre |
Estava lendo ontem, com algum atraso, um jornal de novembro do ano passado, que tirei
da pilha no escritório, quando vi a notícia da inauguração do mural em
homenagem a José Lutzenberger (1926-2002), ambientalista, filósofo, cientista,engenheiro agrônomo, paisagista, um dos pioneiros na luta pelo meio ambiente e pela consciência
ecológica no Rio Grande do Sul e no Brasil.
A obra
foi construída na parede lateral do Instituto de Previdência do Estado, na
esquina da Av. Borges de Medeiros com Av. Aureliano de Figueiredo Pinto, em
Porto Alegre, sendo autor o artista visual Kelvin Koubik. Tem 50 metros
de altura por 15 de largura.
Fiquei feliz com a justa homenagem ao
grande lutador da causa ambiental, seguramente aquele que mais a defendeu
naqueles sombrios anos 1970 e depois até sua morte. Foi a pessoa que mais se
expôs na batalha ecológica, sendo alvo de toda sorte de incompreensões por
parte dos que só veem sentido no lucro fácil e imediatista, para quem a
natureza nada mais é do que um atrapalho.
Lutzenberger fez desenvolver o pensamento ambientalista
de forma nunca antes vista entre nós e seu trabalho correu o Brasil e o mundo.
Não por acaso recebeu, além de pedradas, várias distinções, como o Prêmio Nobel
Alternativo.
O belo painel traz o ecologista entre borboletas, bromélias e um lindo pássaro cardeal pousado sobre o indicador esquerdo. A visão do cardeal é especialmente feliz na minha memória afetiva, já que era o passarinho que eu mais gostava quando vim morar em Porto Alegre, no bairro Mont'Serrat, ainda menino.
O Mont'Serrat, o bairro Bela Vista e arredores eram formados, em parte, por chácaras e matos nos quais havia animais e aves por onde a meninada saía em caminhadas e descobertas nos anos 1960. No lugar onde hoje fica o Shopping Iguatemi havia um tambo que abastecia com leite a vizinhança... O cardeal sumiu da paisagem
urbana, assim como aquela natureza. E o velho tambo ficou só na lembrança.
Em 1973, em plena ditadura civil-militar (1964 - 1985), participei do curso de extensão Equilíbrio e Crise do Meio Ambiente, promovido pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. As falas lúcidas e entusiasmadas de Lutzenberger foram fundamentais na minha iniciação ao pensamento ecológico e humanístico, na ventura dos meus16 anos.
Num país como o Brasil a disciplina de Educação Ambiental não poderia faltar em nenhuma escola e universidade, seguindo os ensinamentos do mestre. Para evitar os desastres do presente e os que estão por vir. Para o bem de todos e esperança no futuro.
A Zero Hora de ontem publicou esta foto da querida rosa vermelha do nosso jardim, depois da chuva. Bem haja!
Jorge Finatto
photo: jfinatto |
Jorge Finatto
photos: jfinatto |
Jorge Finatto
hoje após a chuva. foto: jfinatto |
Uma rosa não se explica, não se traduz. A rosa fala por si mesma e seu perfume vale uma fábrica de fragrâncias de laboratório.
A rosa vive para falar com os vivos, embora muita gente leve-a a conversar com mortos nos cemitérios. É a flor entre flores e não se deixa apanhar sem tristeza.
Quando arrancam uma rosa, o mundo perde um pouco a graça. Talvez por isso, e pela brutalidade geral dos dias de hoje, haja tão pouca leveza e encanto nas almas.
A rosa do meu jardim eu não arranco: sinto.
Jorge Finatto
Castelinho Caracol, Canela. photo: jfinatto |
O tempo das bonecas ficou esquecido no sótão. Elas conversam e brincam entre si numa língua só delas.
Jorge Finatto
photo: Lugano, Suíça, j.finatto |
Maria Madalena teve o privilégio de ser a primeira pessoa a ver Jesus após a Ressurreição. Nenhum dos apóstolos teve essa ventura.