domingo, 27 de janeiro de 2013

Série Retratos 7 ( Colonia del Sacramento, Uruguai)




photo: j.finatto



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Autor da photo: Jorge A. Finatto
Pedidos de cópia ou reprodução podem ser feitos ao autor pelo e-mail j.finatto@terra.com.br
As imagens são protegidas pela legislação que regula os direitos autorais.  

sábado, 26 de janeiro de 2013

A aventura do flamingo cor-de-rosa

Jorge Adelar Finatto


Flamingo. Foto: Aaron Logan. Fonte: Wikipédia


O flamingo pousou na popa do veleiro quando passávamos pela Ilha do Barba Negra, na Lagoa dos Patos (que, àquela hora, brilhava sob o sol amarelo e intenso da tarde de fevereiro).

Pousou ao lado de Filipo, o papagaio marinheiro, que estava sentado e distraído na beira do barco, os olhinhos fechados, peito estufado respirando a brisa. Filipo deu um pulo de susto, o boné de marinheiro caiu na água. O flamingo recolheu-o com o bico.

Essas surpresas acontecem na vida de quem navega. Tínhamos saído para dar um giro com nosso veleiro Solitário, a fim de ver as belezas do rio, suas ilhas e pássaros. E também para ficar distante do ruído e do trânsito violento da cidade, da correria agressiva e sem sentido.

Filipo indagou do flamingo, na linguagem das aves, qual era seu nome e de onde vinha. Ele respondeu que se chamava Arquibaldo e que vinha de Amsterdam, sua cidade natal, na Holanda. Vivia com a família num barco abandonado num dos canais daquela bela cidade. Estava em viagem de férias com os pais e irmãos quando o inesperado aconteceu.
 
Amsterdam. photo: j.finatto
 
Na altura do arquipélago dos Açores, uma tempestade dispersou a família de flamingos e arremessou Arquibaldo em outra direção, separando-o do grupo. Depois de vencer o medo e a ventania, voou muito e pegou carona num navio. Acabou chegando ao sul do Brasil após vinte dias. Estava exausto e atordoado com os últimos acontecimentos.

Os flamingos, em geral, têm a plumagem cor-de-rosa. Em Arquibaldo essa cor é ainda mais viva, um rosa antigo belíssimo. Providenciamos uma boa alimentação e um bom descanso para nosso novo amigo.

Arquibaldo é um flamingo adolescente e observador, com bom humor e espírito de aventura. Sentiu-se tão bem que pretende ficar conosco até o final do verão, quando então regressará para junto de sua família na casa-barco de Amsterdam.

O peixinho Moisés, nosso companheiro de navegações, saltou do rio para o interior do barco e ficou dentro do balde conversando com Arquibaldo.

Na Ilha das Pedras Brancas, rumamos em direção ao Parque da Harmonia e, daí, para o velho cais de Porto Alegre, sempre ouvindo a incrível história do mais novo membro da tripulação.

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Mais aventuras do veleiro Solitário em:

Navegador de barco de papel
http://ofazedordeauroras.blogspot.com/2011/08/navegador-de-barco-de-papel.html

A volta do barco de papel
http://ofazedordeauroras.blogspot.com/2010/10/volta-do-barco-de-papel.html

Texto publicado em 10.02.2012.
 

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Série Retratos 6



photo: j.finatto


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Autor da photo: Jorge A. Finatto
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quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

O menino da água-furtada

Jorge Adelar Finatto
 

photo: j.finatto


O habitante da água-furtada sobrevive na memória de um sótão. Veja este álbum invisível que se abre como um segredo sobre a tela do computador.

Aqui está a casa velha de pinheiro, a parreira no quintal amadurecendo a uva moscatel, a janela aberta sobre o telhado para o Vale do Olhar,  a horta com seus aromas e gostos do passado, os pintos correndo no pátio ao lado da casa como pequenas bolas douradas.

O arroio atravessa o fundo do quintal, onde o menino molha a cabeça e os pés e depois se deita na margem, fecha os olhos e voa até as esferas celestes.

O arroio vem não se sabe de onde, passa pelo morador do oblívio e segue adiante, murmurante, risonho, leva os barcos de papel do menino mundo afora.

Hoje os mortos vieram visitar o menino, em silêncio sentaram-se em volta da mesa da sala diante dos retratos. Estavam com a cabeça baixa e sussurravam coisas caladas, suspiravam pelos dias vividos.

Os mortos vieram para o jantar na casa vazia. Depois foram desaparecendo lentamente, um a um, deixando um pó azul e branco no ar.

Os sonhos do menino não estão presos a nada. Em algum lugar bate o sino no meio da noite. O menino da água-furtada abre os olhos.

Tudo ainda tão vivo no coração.

Pedaços de seda coloridos pendurados nos galhos das árvores balançam ao vento.

A solidão descarnada das horas no sótão.
  

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Walmor Chagas e a beleza da palavra falada

Jorge Adelar Finatto


Walmor Chagas em seu sítio, 2006. Foto: Fernando Donasci. Folha da S.Paulo
 
 
No mês de outubro passado, no texto Um bosque no amanhecer*, falei da importância da Biblioteca Pública do Estado na vida de muitas pessoas e na minha em particular. De passagem, relembrei, também, um recital inesquecível do ator Walmor Chagas (1930-2013) apresentado naquela biblioteca, no início dos anos 1980, se estou bem lembrado.

Nunca esqueci aquela apresentação. A beleza da palavra escrita, quando ouvida da boca de Walmor Chagas, era inefável.

Pouca gente sabia dizer um texto como ele, especialmente poesia. O recital Partilha (título de um poema do poeta e escritor porto-alegrense Paulo Hecker Filho, amigo do ator e autor do roteiro), que ele apresentou no Salão Mourisco da Biblioteca Pública, foi um grande momento.

Quem não tinha intimidade com a literatura, ao ouvi-lo, passava a se interessar e ir atrás de textos e autores. Não sei se gravaram o recital em vídeo, tomara que sim.

Walmor Chagas tinha o dom de dar vida ao texto literário, na sua maneira de dizer, bem viva, bem sentida, sem excessos, sem faltas.
 
Infelizmente, o ator foi encontrado morto com um tiro na cabeça, na última sexta-feira, dia 18, na casa de seu sítio no interior da cidade paulista de Guaratinguetá. O corpo foi cremado no sábado. Os dados levantados pela polícia, até o momento, levam a crer em suicídio, segundo informou a imprensa.

Nascido em Porto Alegre, Walmor Chagas tinha um carreira longa e rica, tendo feito novelas e séries para televisão, além de cinema e teatro. Era, essencialmente, homem de teatro e cinema.
 
Depois de assistir Partilha, fiquei imaginando o quanto teria sido bom se o Ministério da Cultura ou outro órgão, até mesmo algum particular, patrocinasse não só peças de teatro como recitais de Walmor Chagas para percorrer o Brasil, levando literatura e despertando leitores com sua voz, sua elegância e sua interpretação de mestre. Além disso, esses programas poderiam ser gravados para televisão.
 
Perdemos Walmor Chagas. Já não será possível vê-lo nem ouvi-lo. O seu talento poderia ter sido melhor aproveitado.  Com sua morte, lá se vai não apenas um grande ator, como também grandes oportunidades perdidas.

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*Um bosque no amanhecer:
http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/2012/10/um-bosque-no-amanhecer.html
 

domingo, 20 de janeiro de 2013

Série Retratos 5 (Drummond em Copacabana)








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Autor da photo: Jorge A. Finatto
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sábado, 19 de janeiro de 2013

A pátria da língua portuguesa

Jorge Adelar Finatto


Fernando Pessoa nos azulejos do Martinho da Arcada*. photo. j.finatto


Após um tempo sem falar português, num país distante, quando, enfim, entrei no avião da TAP, de regresso a Lisboa e, horas mais tarde, ao Brasil, disse aos tripulantes, na porta de entrada da aeronave: a nossa pátria é a língua portuguesa.

Aquilo saiu assim, de repente, quase um desabafo, ao reencontrar pessoas que compartilham o mesmo idioma, depois de um período de exílio longe da língua.

Minha pátria é a língua portuguesa. A frase de Fernando Pessoa, do Livro do Desassossego, trecho 259, expressa essa verdade cósmica e sentimental: pertencemos à língua que nos viu nascer, essa que sussurrou aos nossos ouvidos, nos instantes inaugurais da vida, o som das primeiras palavras de acalanto e consolo.


Amanhecer no oceano perto de Lisboa. photo: j.finatto


Os membros da tripulação não se mostraram espantados com o palavroso passageiro, ao contrário, aderiram à minha saudação, talvez levados por um sentimento de saudades de Portugal e do Tejo, naquela tarde fria do norte europeu.

A maternal língua de Camões nos lambe desde o berço, como lambeu Pessoa, Vitorino Nemésio, Eugénio de Andrade, Carlos Drummond, Heitor Saldanha, Guimarães Rosa, Euclides da Cunha, Henrique do Valle, entre tantos, da mesma maneira que lambe o vendedor de peixe do mercado público de Porto Alegre, a florista da Praça da Aurora, o homem da banca de jornais.

O português cultivado no Brasil enriqueceu-se dos sons e novos sentidos advindos das falas de origem africana, indígena, espanhola e de todos os povos que vieram ao continente brasileiro.

A língua portuguesa, amarga e doce, nos habita, e com ela tentamos nos comunicar no duro ofício de viver, sonhar e sofrer. Essa pátria nos carrega dentro de si aonde quer que nos levem os ventos oceânicos.

A língua é nosso território espiritual no mundo.

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*Café-Restaurante Martinho da Arcada, um dos mais antigos do mundo, em Lisboa. Patrimônio Nacional Português. Nele Fernando Pessoa costumava beber, jantar e receber amigos no balcão do café (foto acima) e na sua mesa cativa. O proprietário de então, reza a lenda, amigo a admirador do poeta (pobre), não cobrava as suas despesas. Há no local cópias de manuscritos, de fotografias e outros documentos do poeta. Fica na Praça do Comércio (ou Terreiro do Paço), sob os arcos, quase à margem do Tejo. Este post foi publicado anteriormente em 28.7.2012. (Jorge Finatto)