Jorge Adelar Finatto
O pássaro amanheceu cantando num galho seco dentro de mim. Não sei de onde veio. Por causa do pássaro saí à rua na manhã de chuva. Em seu louvor fui até a praça. Fiquei ouvindo o vento nos cabelos, respirei o amarelo. Agora quando o medo chega, a melancolia dos entretons, eu abro a porta e vou. Vou ao encontro dos ocres do outono com o pássaro. Ele anda solto nas árvores, nos fios de luz. Às vezes entra no bolso do meu casaco. O pássaro tece delicadas aquarelas com seu canto. São traços de um pintor amoroso. Eu reconheço sua assinatura nas partituras. Não importa o barulho dos motores e das bocas que não param de falar. Folhas secas do outono. Folhas secas das almas. O pássaro leva no bico o canto, a semente, a esperança. O toque suave do amanhecer. O pássaro dentro de cada um. Mel escorrendo na paisagem de abril. Não importa a solidão geral, a insensibilidade glorificada. Estou habitado. O pássaro encontra em mim o abrigo. Eu cuido do pássaro. Ele cuida de mim. Vem de secretos bosques, vem de auroras estelares essa harmonia que enche o coração. As seivas se recolhem. A transição. A claridade de um anjo ilumina a porta. A previsível passagem. O umbral.
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Foto: J. Finatto
Precisamos das coisas simples da Natureza como antídoto para as pesadas faces do cotidiano urbano.
ResponderExcluirEste fim-de-semana estive em Torres e frui deste contato renovador.
Deixo aqui este poema que reflete um pouco esta tentativa de evasão poética.
No pentagrama
da fiação urbana
o pássaro solfeja sua canção
Ricardo Mainieri
Belo poema, me dou conta. Um achado.
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