José Saramago
Dizem-me que as entrevistas valeram a pena.  Eu, como de costume, duvido, talvez porque já esteja cansado de me  ouvir. O que para outros ainda lhes poderá parecer novidade, tornou-se  para mim, com o decorrer do tempo, em caldo requentado. Ou pior,  amarga-me a boca a certeza de que umas quantas coisas sensatas que tenha  dito durante a vida não terão, no fim de contas, nenhuma importância. E  por que haveriam de tê-la? Que significado terá o zumbido das abelhas no  interior da colmeia? Serve-lhes para se comunicarem umas com as outras?  Ou é um simples efeito da natureza, a mera consequência de estar vivo,  sem prévia consciência nem intenção, como uma macieira dá maçãs sem ter  que preocupar-se se alguém virá ou não comê-las? E nós? Falamos pela  mesma razão que transpiramos? Apenas porque sim? O suor evapora-se,  lava-se, desaparece, mais tarde ou mais cedo chegará às nuvens. E as  palavras? Aonde vão? Quantas permanecem? Por quanto tempo? E,  finalmente, para quê? São perguntas ociosas, bem o sei, próprias de quem  cumpre 86 anos. Ou talvez não tão ociosas assim se penso que meu avô  Jerónimo, nas suas últimas horas, se foi despedir das árvores que havia  plantado, abraçando-as e chorando porque sabia que não voltaria a  vê-las. A lição é boa. Abraço-me pois às palavras que escrevi,  desejo-lhes longa vida e recomeço a escrita no ponto em que tinha  parado. Não há outra resposta.
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Publicado com autorização da Fundação José Saramago
http://www.josesaramago.org/
Texto extraído do blog O Caderno de Saramago
http://caderno.josesaramago.org/.
Postado originalmente em 16 de novembro, 2008.
A grafia é a de Portugal.
Foto de José Saramago (1922 - 2010) :  Acervo da FJS

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 
 
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